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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Cimeira Franco-Alemã

1. Os eurobonds têm sido encarados por muitos com demasiado optimismo mas são melhores do que nada. Se não há eurobonds nem defaults parciais, a dívida total da zona euro, com tanto novo endividamento, tantos planos de ajuda e tantos bailouts, cresce para níveis incomportáveis colocando em risco não só o euro mas a própria União Europeia.

2. Concordo com o Luís Menezes Leitão: "o governo económico europeu" presidido por aquele não se sabe quem será mais um veículo do abuso de poder alemão (e também francês).

3. A taxa sobre as transacções financeiras será uma maneira de tornar a Europa cada vez menos relevante na cena financeira internacional. A recente notícia da proibição de short selling de activos financeiros, ainda que só durante quinze dias, já foi uma monstruosidade anti-liberal. No mundo globalizado (desculpem lá o cliché), as regiões mundiais que mais proibem são as que mais perdem. E os surtos de proteccionismo são quase sempre a ante-câmara da guerra.

4. "Os dois líderes (...) consideraram também "suficiente" a dotação orçamental do fundo europeu de resgate" (no Expresso).

 

Então vejamos: não há eurobonds (pelo menos para já), não há defaults parciais (pelo menos até depois das eleições na Alemanha) e não há aumento do fundo europeu de resgate (Durão Barroso já alertou várias vezes para a insuficiência do mesmo). O que é que há então de novo?

 

Tendo em conta que as medidas de austeridade na Itália, Espanha e França não são credíveis devido à proximidade das eleições (antecipáveis, antecipadas e previstas) - não há rigorosamente nada de novo no sentido de trazer acalmia aos mercados.

 

Esta cimeira foi, portanto, mais uma perda de tempo com o único fim de empolar a imagem internacional de Sarkozy e de Merkel para consumo populista interno (os franceses adoram que os seus políticos tenham ou aparentem ter relevância internacional, os alemães adoram acreditar que são mais progressistas que os outros europeus todos e acham que ter uma chancelerina mulher é o supra-sumo da superioridade progressista).

 

A consequência óbvia é esta: os mercados continuarão cada vez mais a castigar a Espanha, a Itália e a França. Com "líderes" desta estirpe, pobre União Europeia...

Mutualização da Dívida: uma Enormidade de Problemas

Os eurobonds têm um elemento de mutualização das dívidas públicas da zona euro, o que significa que um conjunto de países passa a responder solidariamente pelo cumprimento das obrigações de qualquer um dos membros desse conjunto (até um certo limite que, porém, não é nada pequeno).

Esta mutualização implica três problemas, dois dos quais já descritos anteriormente (aqui e aqui): muitos dos países da zona euro podem muito simplesmente não querer fazer parte deste acordo, pelo que a mutualização das dívidas públicas poderá ficar limitada a que apenas países como a França e a Alemanha se responsabilizam pela dívida de alguns países, enquanto outros começam seriamente a equacionar a saída do euro como forma de se eximirem às obrigações que nunca foram suas.

Uma mutualização limitada à França e à Alemanha não será muito diferente da actual situação em que aqueles dois países têm liderado (muito mal, diga-se) o processo de resposta à crise das dívidas soberanas. Por outro lado, forçar essa mutualização tem como efeito o aumento de popularidade das facções e partidos políticos anti-União Europeia. Basta juntar esse fenómeno aos programas de austeridade e à violência nas ruas e teremos a União a desintegrar-se irremediavelmente.

O outro problema é de credibilidade. À medida que mais e mais endividamento, mais e mais bailouts se sucedem, a crise do euro vai-se transmitindo dos pequenos países periféricos para economias que, pela sua dimensão, não podem ser resgatadas totalmente. Se até a relativamente pequena economia da Grécia não se livrou de um default parcial, é mais do que certo que, em caso de crise de pagamentos, é impossível não ocorrer um default parcial da dívida de Espanha, Itália e França. Em tal caso, será o rating dos eurobonds que se degradará. Ora toda esta dinâmica, que é previsível desde já, tem como consequência que os eurobonds não beneficiem de rating triple A nem sequer à nascença.

O terceiro problema da mutualização da dívida é o défice de democracia. O princípio de no taxation without representation é violado. Porque é que o contribuinte finlandês, que nunca votou nem aprovou o "welfare state grego" há-de responsabilizar-se por esse sistema?

 

Certo é que quase todo o processo da construção europeia tem sido realizado com uma adesão insuficiente aos princípios da democracia. Mas isso não era especialmente problemático enquanto a aceitação popular da integração europeia era generalizada e o efeito mais visível da União correspondia a dinheiro a entrar.

 

Já no caso da "solidarização" pelas dívidas dos outros, a opinião geral é desfavorável e o resultado é dinheiro a sair, sendo que o objectivo desse dinheiro não é nenhum projecto benemérito mas sim cobrir os excessos, irresponsabilidades e megalomanias de países que não foram capazes de se governar sem a ajuda in extremis dos outros.

É preciso notar que ainda que os países em risco de incumprimento aceitem que toda a sua política de finanças públicas seja escrutinada pelo "eurobond group" (o que é em si mesmo uma afronta à soberania e democracia dos países em causa) - o mesmo défice de democracia mantém-se, pois (se percebi bem) a mutualização das responsabilidades recai não só sobre a dívida contraída no futuro mas também sobre a dívida anterior. Mas de qualquer forma, ainda que esteja em causa apenas a dívida futura, esta é emitida para refinanciar dívidas passadas pelo que, economicamente, a mutualização da dívida implica sempre uma responsabilização por decisões passadas, o que viola o referido princípio de no taxation without representation.

O défice de democracia é mais uma força no sentido do desmoronamento do edifício europeu. E é mais uma razão para parar a bola de neve dos endividamentos e bailouts sucessivos enquanto é tempo. Isto é, enquanto a crise não chega à Itália e à França e enquanto a própria União Europeia ainda se encontra a salvo.

Default/Reestruturação: o Sarkozy e a Merkel

 

Se Nicolas Sarkozy e Angela Merkel tomassem hoje e agora a decisão de provocar o default parcial das dívidas grega e portuguesa, os eleitorados francês e alemão sentir-se-iam de tal modo lesados e, até, roubados pelos países do sul europeu que o resultado inexorável e com probabilidade absoluta seria que Sarkozy e Merkel não seriam reeleitos.

 

Sendo assim, vai ser preciso esperar pelas eleições na França (Abril ou Maio de 2012) e na Alemanha (Setembro ou Outubro de 2013) para que se trave de vez a espiral dos sucessivos endividamentos, ajudas e bailouts aos países do sul da Europa.

 

O que determinará o timing dos defaults parciais grego e português não terá nada a ver com razões de natureza económica mas exclusivamente com o eleitoralismo vil de Sarkozy e Merkel.

 

Enquanto se espera pela reeleição daqueles dois e se vai deixando aumentar a massa total de dívida para níveis ainda mais incomportáveis, é a própria sobrevivência financeira e monetária da Zona Euro que é colocada em risco. Travar o ciclo de endividamentos e bailouts tem custos eleitorais directos para Sarkozy e Merkel mas é a melhor forma de salvaguardar o futuro do euro e da União Europeia. O mais recente bailout grego de cento e nove mil milhões de euros foi uma insanidade difícil de qualificar depois da loucura que já tinha representado o primeiro bailout de cento e dez milhões de euros.

 

De igual forma, Portugal optou erradamente por um pacote de "ajuda" a taxas insustentáveis em vez de ter procedido a uma reestruturação negociada da dívida. Menos mal que na passada cimeira europeia os juros foram aliviados para valores inferiores a quatro por cento (tal como eu reclamava na minha "chantagem dos três por cento" aqui, aqui e aqui).

 

Mas por que razão não foram logo propostos a Portugal juros minimamente razoáveis? E quantos milhões e oportunidades terá o nosso país perdido enquanto esperava pelos juros mais baixos saídos da cimeira europeia?

 

A razão foi que o castigo dos países do sul por via de taxas de juro insanas servia os interesses populistas de Sarkozy e Merkel. Quanto às perdas que Portugal terá eventualmente sofrido, esse é o assunto que menos importa aos actuais líderes da França e da Alemanha.

Federalização e Estado Social

Uma possível federalização da União Europeia e o fim de um certo Estado social são outros dois temas que irão acompanhar os europeus nos próximos anos. Este post do Luís Naves sugeriu-me estes dois pensamentos:

 

A federalização vai ser feita de forma não democrática (nem eleições nem referendos) e, muito provavelmente, pela mera via intergovernamental. E, pior, essa via não vai abranger todos os países. A bicicleta europeia está a ser reduzida ao tandem Sarko-Merkel, o que é péssimo.

Mas o que actualmente se passa na Europa não me parece uma crise do sistema capitalista (e muito menos o fim de uma civilização): é antes (e "apenas") o descalabro de um certo tipo de Estado social: aquele que é baseado no empolar dos funcionários públicos para criar uma classe média; em que se dá mais importância à redistribuição do que à criação de riqueza; em que o eleitoralismo é alimentado por megalomanias sustentadas por dívida e mais dívida; e em que concorrência, mérito e liberdade económica são considerados pecados.

 

A Europa ocidental e do sul livrou-se dos horrores do comunismo. Os excessos esquerdistas foram, no entanto, muitos. A factura desses excessos está aí para ser paga - pelas actuais e futuras gerações.

O fim da Europa, ou uma nova organização das nações europeias?

 

A Ana Sá Lopes, no editorial do i de hoje, coloca a questão como ela deve ser colocada: perante o eminente colapso financeiro de Espanha e Itália, a União Europeia e a moeda única poderão continuar a existir nos mesmos moldes?

Obviamente que não. E por mais pessimista que possa parecer, a Ana Sá Lopes tem razão quando afirma que só há duas soluções possíveis: ou o federalismo político, ou o fim do euro e do sonho europeu. Qual iremos escolher? Gostava de começar a ver os partidos a assumirem posições sobre o assunto.

O regresso da doutrina Brejnev?

 

 

Depois das recentes declarações de Jean-Claude Juncker à Focus sustentando que a contrapartida da concessão de ajuda externa seria uma forte limitação da soberania da Grécia, surgem agora estas declarações à Stern do Ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schaeuble, segundo o qual os Estados que no futuro reclamarem ajuda externa deverão ser objecto de sanções mais fortes e terão que ceder parte da sua soberania à União Europeia, já que tal será para eles sempre muito melhor do que a pura e simples expulsão do euro.

 

Tudo parece convergir para uma repetição, a nível da União Europeia, da célebre doutrina Brejnev, segundo a qual todos os Estados membros do bloco socialista teriam a sua soberania limitada, tendo que aceitar a ingerência da União Soviética nos seus assuntos internos e não podendo ser autorizados a abandonar o pacto de Varsóvia, uma vez que as fronteiras internacionais do bloco socialista não poderiam ser alteradas. Agora também os Estados membros da União Europeia que se virem obrigados a recorrer à ajuda externa deixam de ser países soberanos para se tornarem protectorados da própria União, à qual estarão obrigados a ceder a sua soberania para evitarem uma catástrofe económica.

 

Desde a queda do muro de Berlim em 1989 que não se assistia a nada de semelhante na Europa. Estará a União Europeia a caminho de se transformar num novo pacto de Varsóvia? Se assim for, a extraordinária obra de visionários que representou a construção europeia ter-se-á tornado num pesadelo para os Estados membros em dificuldades.

Resposta à Resposta da Perguntazinha

Caro Vasco, quem não tem Münchau caça com Campilho. Obrigado pela resposta! Não tenho agora tempo para responder em extensão e profundidade mas vou tentar mariposa porque estou prestes a viajar para um país bonito e deveria ir dormir mas considero que...

 

...primeiro: outra vez um limite de 40% ou 60% do PIB? Onde é que já vimos isto? E onde é que já vimos este tipo de regra ser respeitada? Volto pois a colocar em cima da mesa a minha perguntazinha e as minhas dúvidas quanto à credibilidade;

 

...segundo: seniority tem muito que se lhe diga. Há aqui um certo elemento de chantagem que só pode ser classificado de uma maneira: default. Ou compras eurobonds, trocando com desconto as bonds nacionais, ou ficas com as bonds nacionais e perdes dinheiro. De qualquer forma, os credores perdem dinheiro: nada que eu já não tenha previsto e que todos os economistas não-políticos (?!) não estejam já fartos de saber. Os eurobonds têm toda a aparência de serem um plano pelo menos tão bom como as alternativas para levar a cabo um default parcial e selectivo de forma amigável (como é que se diz "lol" em linguagem económica?). Mas isso só por si não garante credibilidade nem triple A, talvez garanta que o rating dos eurobonds seja superior ao das dívidas nacionais, o que já não é mau;

 

...terceiro: joint and several liability: esta é tão pouco credível que pode, só por si, fazer com que os países não se consigam entender sequer quanto à criação dos eurobonds. Mas isto traz ainda outro problema no bico: se a "Europa" (quem é a Europa? pois) hesita e não resolve o problema de PEQUENAS economias como é o caso da grega, irlandesa e portuguesa, nada nos garante que consiga resolver problemas maiores mesmo com eurobonds. Aliás, os eurobonds podem acabar por servir para facilitar o ainda maior endividamento de países como a França e a Itália. Isto tem a ver menos com o meu post da perguntazinha e mais com o post da Itália Aí Tão Perto. Como dizia o Wolfgang no outro dia, uma França ou "apenas" uma Itália não tem capacidade de se resgatar a si própria e a Europa, ainda que junta, também não tem (já tem sido um martírio resgatar qualquer uma das PEQUENAS economias periféricas, nem é bom pensar se o país a precisar de resgate for médio ou grande).

 

Se, se, se os problemas chegarem à Espanha e/ou à Itália a Europa, mesmo que "junta e solidária" e mesmo que com eurobonds fica num grande sarilho e, nesse caso, tal como escrevi no últmo post nem em sonhos azuis com estrelinhas amarelas irão os eurobonds ter triple A. Imaginem que quem tem dificuldade em pagar à entidade emissora dos eurobonds (quem?) é uma Espanha ou Itália: estarão em causa números com muitos algarismo "zero" à direita, mesmo muitos: quem é que vai cobrir o dinheiro em falta? Se calhar é a China, se esta estiver disposta a fazer parte dessa Europa "junta e solidária" (e a Europa gostar da solução)...

 

 

 

P.S.: Adorei o "esquissei".

 

P.S.2: Se os eurobonds são masculinos, então as bonds serão femininas?

Lieber Wolfgang Münchau, uma Perguntazinha sobre Eurobonds...

Lieber Wolfgang Münchau,

como tem passado? O tempo aí em Bruxelas? Mauzinho e de chuva? Acredite que é bem melhor do que os trinta e nove graus Celsius e positivos daqui de onde lhe escrevo.

 

Continuando pela meteorologia europeia, estou de acordo consigo que os eurobonds têm toda a aparência de serem um plano pelo menos tão bom como as alternativas. O que me preocupa é que a bondade dos eurobonds depende de uma hipotesezinha cuja validade não me parece evidente.

Os eurobonds terão um rating triple A (ou seja, AAA, isto é, á-á-á) e, por isso, haverá todo o incentivo a que os detentores de dívidas nacionais com ratings muito inferiores as troquem com desconto por eurobonds. O efeito será uma diminuição do valor do stock total de dívidas dos vários países europeus, o que contribuirá para a solvabilidade de cada país e, logo, para a sobrevivência do euro.

A minha perguntazinha é esta: mas quem é que garante que os eurobonds terão rating triple A??? É a senhora Viviane Reding que irá encostar uma arma à cabeça da Moody's e obrigá-la a dizer que os eurobonds são excelentes e credíveis e valem a pena? Pois...

Se a União Europeia não conseguiu levar a que todos os países da zona Euro respeitassem os critérios de Maastricht, se se deixou enganar pela contabilidade pública mentirosa da Grécia aquando da entrada desta no Euro, se tem sido tão titubeante e serôdia na reacção às crises na Irlanda, Grécia e Portugal - quem e como é que irá garantir que, desta vez, este novo plano europeu não sofrerá de um problema de credibilidade?

As várias crises europeias somadas têm uma causa e um nome comuns: défice de credibilidade: das instituições, das regras e dos vários planos apresentados.

Quem garante a credibilidade do novo projecto "eurobonds"? É esta a perguntazinha que lhe deixo.

 

Continuação de boa semana, viele Grüße

Ricardo Vicente

União Europeia a Resvalar

Discordo do António Figueira, concordo com o Luís Menezes Leitão:

 

1) Sair do Euro (a Grécia) quase que implica sair da União Europeia: começa com a imposição do controlo de capitais e seguem-se outras restrições: na prática, as componentes mais básicas da União Europeia deixarão de ser aplicadas. E, como afirma e bem Luís Menezes Leitão, a saída de um país da União é o princípio do desmoronar da mesma.

 

2) A moeda única, por estranho que possa parecer, é um desígnio europeu: basta lembrar que todos os países das últimas adesões (os dez que entraram em 2004 e os dois do último alargamento) NÃO têm opção de ficar de fora do euro. Foram estes países que assim quiseram auto-limitar-se ou terá sido isto uma exigência dos país que já faziam parte da União? E, de entre estes, quais terão sido mais veementes nessa imposição?

 

3) "A aceitação da moeda única pela Alemanha" e "A Alemanha aceitou o euro": estas expressões, se compreendi bem, parecem sugerir que o euro terá sido um terrível sapo engolido pela Alemanha. É um erro de análise gigantesco esse de que a Alemanha engoliu um sapo e de que fez um grande favor ao resto da Europa: a Alemanha é a maior beneficiária da moeda única. E está melhor com o euro do que estaria com o seu marco robusto mas rodeado de moedas fracas prontas a desvalorizarem-se por tudo e por nada.

 

Se a aceitação do euro na Alemanha não foi coisa popular na altura e se hoje os alemães pensam que o euro não lhes trouxe benefícios líquidos (se é que, de facto, a maioria deles pensa assim) - é porque também o eleitorado alemão se engana e vota mal ("lembram-se" de Março de 1933?) e o seu conhecimento económico não é infalível. A questão principal não é a Alemanha ter abandonado a sua moeda forte. A questão relevante é a Alemanha ter deixado de ser prejudicada por várias moedas prontas a serem desvalorizadas a qualquer instante (as dos seus parceiros económicos antes de aderiram ao euro).

 

4) Tema para paper: quantificar os ganhos acumulados decorrentes do euro (e, de caminho, da criação do Sistema Monetário Europeu) para a Alemanha e compará-los com as perdas de uma eventual default grego e hair cuts das dívidas irlandesa e portuguesa.

O desmoronar da União Europeia.

 

 

 

Esta notícia avançada pelo Der Spiegel de que a Grécia se prepara para sair do euro e já elaborou um plano para reintroduzir uma moeda própria representa, a ser verdadeira, a colocação em ruínas do edificio jurídico da União Europeia, que há 60 anos tem vindo a ser paulatina e laboriosamente implementado. Efectivamente, nada está previsto nos Tratados em relação à possibilidade de um Estado-Membro abandonar o euro, estando apenas contemplada a possibilidade de saída da União Europeia. A concretizar-se esta saída, seria a primeira vez que um Estado-Membro deixaria a União, dado que a prévia saída da Gronelândia nada mais representou que a não aplicação dos Tratados a uma região não europeia governada pela Dinamarca. A saída da Grécia, com o simbolismo de ser o país fundador das raízes da civilização europeia, representaria um sério revés para o projecto europeu, do qual este dificilmente recuperaria.

 

Tudo isto demonstra que não temos governantes europeus à altura das suas responsabilidades. Quando se assiste a uma profunda crise das dívidas soberanas dos Estados-Membros a resposta a essa crise deveria ser dada pela União Europeia em conjunto. Sucede, porém, que os governantes da União não têm dado a resposta que se impunha à crise, deixando o poder ser exercido pelos governantes dos Estados-Membros mais poderosos. E estes só têm demonstrado tomar em considerar os interesses dos seus cidadãos, até pretendendo castigar os outros Estados-Membros pelas dificuldades financeiras que atravessam, como se essas dificuldades não fossem já castigo suficiente. Assim sendo, a União Europeia de União já não tem nada, não passando de uma soma de egoísmos nacionais.

 

A saída da Grécia será uma autêntica tragédia grega para a União Europeia. Claro que haverá muitos que aplaudirão e até salientarão que é a solução mais racional do ponto de vista económico. Mas do ponto de vista político, estaremos perante o verdadeiro colapso de qualquer projecto de criar uma União Europeia forte e com influência mundial. O gigante económico europeu deixará de ser um anão para se transformar num micróbio político. É bom que se tenha consciência disso.