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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Aplaudir de Pé: Medina Carreira

«Temos de mexer em seis ou sete coisas essenciais (...). Tenho um método para atacá-las (...). É fazer um estudo comparativo com os países da Europa do Leste sobre aquilo em que estamos desfavoráveis (...). "Isto precisa de ser mais flexível!" Os empregados dizem: "Não, isto já é flexível de mais!" A conversa morre sempre aí. Ao passo que, se se trouxer uma descrição sobre o que é o regime laboral nos países com que temos de competir, é diferente a discussão» diz Medina Carreira numa entrevista ao DN.

Um dos maiores problemas da mentalidade política portuguesa é o de fazer comparações com a França e a Alemanha. Portugal é sempre comparado com o incomparável. Julgamo-nos ricos como os cidadãos daqueles dois países que tantos emigrantes portugueses acolheram e acreditamos que podemos e merecemos o mesmo rol de direitos sociais.

A verdade é que os direitos sociais de uma França ou de uma Inglaterra são incomportáveis em Portugal: não há riqueza suficiente nem redistribuição do rendimento por mais exótica que seja que nos possa valer. Somos demasiado pobres: este é o facto mais essencial, mais fundo, o primeiro princípio da realidade portuguesa que não entra nas cabeças nem dos políticos nem do povo.

Em muitos aspectos, o Portugal económico e social é mais legitimamente comparável a uma Estónia ou Hungria. Os salários portugueses deveriam ser confrontados com os dos trabalhadores polacos. Os direitos sociais portugueses deveriam ser indexados a uma média baseada na "Europa de Leste".

Ora isto não acontece por três razões, de natureza histórica, cultural e política.

Razão histórica: a grandeza do Portugal das Descobertas, a que se seguiram os impérios espanhol, holandês, francês e inglês - faz-nos crer ainda que Portugal joga na primeira divisão da Europa. Comparamo-nos mal no presente com aqueles aos quais nos comparávamos bem no passado.

Razão cultural: a maior proximidade cultural com a Europa ocidental. Língua, religião, hábitos, etc.. Comparamo-nos com o que nos é mais próximo e mais inteligível. Também o efeito da emigração: há décadas que conhecemos bem as franças, suíças, alemanhas. Mas quem é que tem parentes emigrados na antiga Europa comunista?

Razão política: a ilusão de que se nos compararmos aos melhores seremos como eles. Lamentavelmente, nem as gentes nem os governantes percebem que, para chegarmos a uma França, teremos primeiramente de passar por uma Eslováquia.


 

Originalmente publicado a 10 de Outubro de 2010 aqui.

O conflito de gerações

Henrique Raposo, aqui, coloca o problema ao contrário. A geração do Henrique trabalha a recibos verdes. Sim, mas a culpa não é minha, que tenho contrato na empresa onde trabalho.

 

Há aqui simplificações que vale a pena discutir.

Escreve o Henrique: "Um empresário que tem de pagar 30 anos de indemnização por x não vai meter malta nova na empresa, e quando mete, mete a recibo verde". Outra citação: "Portugal não aceita que o empresário é o motor da economia".

O Henrique não parece entender que os "velhos" contratos foram do interesse das empresas que os assinaram. Quando eu fui contratado, era um bom trabalhador disponível no mercado. Os recibos verdes, à época, eram raros e vantajosos, mas serviam para profissões liberais bem pagas. Com o mesmo contrato, duas décadas depois, continuo a ser produtivo, até mais do que era, pois tenho memória e experiência. A velhice conta no trabalho, desde que não seja a cavar valas. Mas o conceito dos recibos verdes foi abusado pelas empresas, que os aplicaram a todos os trabalhadores, criando duas velocidades no mercado. Depois, com o aumento do desemprego, a fórmula tornou-se explosiva, surgindo uma pressão para quebras salariais nos diferentes sectores e criando nos locais de trabalho a ilusão de que enquanto os velhos não forem despedidos, os jovens não sobem.

 

Por outro lado, o trabalhador antigo, se fosse bom, tinha aumentos salariais ao longo do seu contrato, ficando cada vez mais caro. Ora, se houver no futuro uma lei que facilite o seu despedimento, torna-se vantajoso para a empresa despedir o mais velho e contratar um mais novo, não por este ser mais inteligente ou produtivo, mas apenas porque é mais barato. Trata-se de competitividade chinesa, que atingirá tanto os trabalhadores de qualidade como os menos produtivos.

Com esta proposta de lei, o trabalhador novo vai receber contrato? Não. Fica a recibos verdes. Nos raros casos em que houver contrato, a empresa demorará 12 anos a obter o incentivo ao despedimento por via da indemnização mais barata. Que lhe adianta isso? E qual será a taxa de desemprego daqui a 12 anos?

Mas se, por qualquer loucura que se adivinha no horizonte, se alargasse isto a todo o universo laboral, apenas se trocava contratado por recibo verde.

Os trabalhadores "velhos" iriam para a rua, ainda por cima numa idade em que não encontravam trabalho. Condenava-se uma geração à pobreza sem tirar a outra da precariedade.

Mas pensando só na actual proposta, a antiguidade deixa de ter interesse, o que é absurdo. Um trabalhador há 12 anos na empresa recebe a mesma indemnização que receberá outro com 30 anos, isto quando a lei se aplicar a todos, daqui a três décadas.

 

Para o Henrique, os trabalhadores são calões. O que é mesmo económico é ser empresário. Eu não vejo como é possível separar as duas funções.

Mas a frase levanta uma questão. Que raio de sociedade estamos a defender? Uma sociedade em que se fazem divisões destas, como se houvesse uma irreconciliável guerra de classes? Uma sociedade onde triunfa o conceito de conflito de gerações? Onde a culpa da minha precariedade está na segurança do meu pai? 

Contra o país real

        

 

 

 

Enquanto o País se distrai com questões de espuma, como eleições em clubes e outras trivialidades, estão a ser preparadas algumas surpresas disfarçadas de reformas estruturais. É o caso desta reforma em negociação, um "velho sonho" do patronato, que promete talvez centenas de milhares de desempregados, condenando todos os trabalhadores portugueses a um destino chinês.

Já escrevi aqui sobre o tema, quando surgiram as primeiras notícias. Na altura, falei em "engenharia social" do pior género, mas na realidade as propostas apontam para "dumping" social. Portugal será mais competitivo porque os seus trabalhadores serão despedidos com uma facilidade que não existe nos restantes países europeus. Com as indemnizações propostas, os patrões terão forte incentivo para despedir os trabalhadores mais velhos. Não apenas será barato fazê-lo, mas compensará substituir pessoas que têm salários mais altos devido à sua antiguidade na empresa.

No fundo, o mercado laboral português só terá precários. Os que já o são e os que se preparam para o ser. Com a actual lei, um trabalhador que ganhe 700 euros por mês (e faço as contas por alto), com 30 anos de empresa, receberia uma indemnização mínima de 21 mil euros no despedimento; se os valores propostos pela CIP forem aprovados, receberá à volta de 4 mil euros, apesar de lhe faltarem 10 anos para a reforma. É um quinto da verba. A proposta da CCP é um pouco mais generosa, 6 mil euros, ou um terço. Mas também será o mesmo que um trabalhador com 12 anos de casa, o que penaliza a lealdade e a experiência.

Curiosamente, estas propostas concentram-se nos valores mínimos, não nos máximos. Um gestor que ganhe 10 mil euros, que tenha doze anos de empresa, receberá 120 mil. Isto é absurdo. Os pobres pagam a crise.

 

Existe aqui outro problema. Se os trabalhadores mais idosos forem sistematicamente despedidos, terão de ficar no desemprego (que o Governo ainda lhes pode tirar) ou numa qualquer prestação social (que o Governo ainda lhes pode tirar). Se não forem sustentados pelo Estado, serão hiper-pobres; se forem sustentados, o orçamento é que paga a competitividade chinesa das empresas. Mas a dita reforma pode criar centenas de milhares de desempregados e aumentar a pobreza a um nível insustentável.

Isto não é social-democracia nem socialismo. É apenas estúpido e contra o País real. O Governo deve optar por uma solução gradual e socialmente justa na questão das indemnizações aos trabalhadores mais antigos.

 

Um post de esquerda (anestesia geral)

A sociedade portuguesa está anestesiada e as notícias sobre a redução das indemnizações em despedimentos mostram-nos uma esquerda cínica e sem futuro. Este País não é para novos e amanhã nem será para velhos.

 

Os trabalhadores servem uma empresa durante anos e, mal começam a ter cabelos brancos, passam à categoria de dispensáveis. São caros em comparação aos mais jovens, têm contratos inflexíveis e descontam para a segurança social. A sua vida familiar e as preocupações com filhos fazem-nos resistir à ideia de jornadas de trabalho demasiado longas.

A Economist da semana passada tinha um gráfico interessante sobre as exportações de alguns países em crise na Europa. Curiosamente, Portugal era o mais exposto à concorrência com a China, o que significa que muitas empresas tentam ser competitivas através dos salários baixos e do dumping social. Nós sabemos que há dois patamares de emprego, o dos precários e o dos fixos, com grandes injustiças salariais e uma geração mais nova forçada a ficar pouco tempo em cada emprego ou a aceitar condições miseráveis e temporárias. Apesar de terem mais formação, estes trabalhadores não chegam a ganhar experiência. Muitos vivem do desenrascanço. Outros 300 mil nem estudam nem trabalham.

 

Para flexibilizar o mercado laboral, o Governo aderiu à ideia da reduzir as indemnizações, tornando assim barato o despedimento dos trabalhadores mais antigos. O preço alto das indemnizações impedia esses despedimentos.

A meu ver, estamos no domínio da engenharia social. Isto só podia ser feito com pleno emprego e não com uma taxa de desemprego de 11%. Compreendo o argumento económico (há flexíveis e fixos, o que é injusto) mas a questão está no efeito da medida. O que fazer com os milhares de trabalhadores que serão despedidos por que isso se tornou subitamente conveniente e acessível para a sua empresa? Num contexto de concorrência chinesa, são redundantes. Num País onde o patronato não tem consciência social, ficam de repente vulneráveis. 

Estas pessoas não terão idade para emigrar ou para reconversão laboral (ao contrário dos jovens), não têm descontos suficientes para a reforma e não terão trabalho, excepto eventualmente biscates precários para alguns deles. A solução para o problema de termos uma geração sem perspectivas será criar duas gerações sem perspectivas. Os jovens já são pobres e assim ficam, os velhos para lá caminham.

 

Tudo isto será feito em nome da crise financeira (porque os contribuintes precisam de ressarcir os banqueiros das suas lamentáveis perdas), por um Governo em pânico, dito socialista e de esquerda, com o ámen de sindicatos em vias de extinção e que têm os mesmos dirigentes desde que me lembro.   

 

Redes Sociais: dos alfinetes e dos elefantes

 

As Redes Sociais atingiram um ponto tal que hoje é impossível ser indiferente à sua influência e importância enquanto ferramenta de comunicação de massas. As Empresas, as Instituições Públicas e os Particulares utilizam-nas para os mais variados fins.

 

De quando em vez alguém se lembra de proibir ou limitar o acesso a estas ferramentas. A desculpa é sempre a mesma: os trabalhadores não trabalham pois andam entretidos nas redes sociais. Ontem não trabalhavam por causa do cigarrito ou da casa de banho ou do telemóvel ou por serem judeus, quiçá pretos, maybe ciganos e de certeza gays!

 

Nestas alturas lembro-me sempre do filme “Je vous salue, Marie” e da fantochada contra o dito via brigada dos bons costumes. Resultado, um filme fracote tornou-se um mega sucesso de bilheteira. Proibir o acesso às redes sociais, ao mais puro estilo Kim Il Sung, não é apenas uma estupidez, é um rematado disparate – se não entra pela porta, entra pela janela e aqui a janela tanto pode ser o telemóvel como o iPad ou um mero atalho digital criado para contornar a proibição.

 

Se o trabalhador tiver uma tarefa bem definida e um prazo para a executar e não cumprir, seja por culpa da rede social ou do telemóvel ou do calor, deverá responder pela sua falta de profissionalismo. Querer apontar o dedo a outros motivos é hilariante. Mais grave é quando o problema está no facto de não lhe terem sido atribuidos objectivos e/ou prazos para cumprir e por isso ter tempo para andar entretido noutras coisas

 

Pensar que o problema da produtividade se resolve com este tipo de medidas é querer implicar com os alfinetes enquanto os elefantes se passeiam livremente pela sala…

 

 

Adenda: escrito na minha hora de almoço que isto aqui está, felizmente, cheio de prazos e objectivos a cumprir. Ainda bem, para evitar morrer de tédio.