Se o governo se limita ao que acordou com a tróica e com o PS será completamente impossível não incorrer num "evento de crédito", i.e., incumprimento, default, etc. no curto prazo.
Por outro lado, só o que a tróica exige é pouco para prevenir um embaraço idêntico no futuro. O stock de dívida deve ser suficientemente baixo para que, em caso de crise, seja possível aumentar o endividamento sem que com isso se coloque em causa a sustentabilidade dinâmica das contas públicas. Esta é a lição que António Guterres, George W. Bush e outros não aceitaram.
Finalmente, ir para além do acordo da tróica significa alterar as estruturas económicas do país para que este possa finalmente crescer.
Enquanto a França anuncia um imposto extraordinário de 3% a ser pago unicamente pelos contribuintes que ganham rendimentos acima de 500000 euros, e a aplicar só em 2012, Portugal já demonstrou que é possível ir muito mais longe. O imposto extraordinário cá é de 3,5%, a ele só escapam os indigentes e os rendimentos de capitais, é aplicado já aos rendimentos de 2011 e será pago em grande parte ainda no fim deste ano. Aqui temos um exemplo típico do entendimento que em Portugal se tem da equidade fiscal. Como é que a França não se lembrou disto para assegurar um orçamento ainda mais equilibrado já em 2011?
Enquanto mais de metade dos meus últimos posts têm sido sobre a necessidade de realizar quanto antes uma reestruturação parcial não só da dívida grega mas também da irlandesa e da portuguesa, em vez de se esperar pelas eleições na França e na Alemanha - já Nouriel Roubini lança para cima da mesa o cenário da reestruturação espanhola e italiana.
Se Nicolas Sarkozy e Angela Merkel tomassem hoje e agora a decisão de provocar o default parcial das dívidas grega e portuguesa, os eleitorados francês e alemão sentir-se-iam de tal modo lesados e, até, roubados pelos países do sul europeu que o resultado inexorável e com probabilidade absoluta seria que Sarkozy e Merkel não seriam reeleitos.
Sendo assim, vai ser preciso esperar pelas eleições na França (Abril ou Maio de 2012) e na Alemanha (Setembro ou Outubro de 2013) para que se trave de vez a espiral dos sucessivos endividamentos, ajudas e bailouts aos países do sul da Europa.
O que determinará o timing dos defaults parciais grego e português não terá nada a ver com razões de natureza económica mas exclusivamente com o eleitoralismo vil de Sarkozy e Merkel.
Enquanto se espera pela reeleição daqueles dois e se vai deixando aumentar a massa total de dívida para níveis ainda mais incomportáveis, é a própria sobrevivência financeira e monetária da Zona Euro que é colocada em risco. Travar o ciclo de endividamentos e bailouts tem custos eleitorais directos para Sarkozy e Merkel mas é a melhor forma de salvaguardar o futuro do euro e da União Europeia. O mais recente bailout grego de cento e nove mil milhões de euros foi uma insanidade difícil de qualificar depois da loucura que já tinha representado o primeiro bailout de cento e dez milhões de euros.
De igual forma, Portugal optou erradamente por um pacote de "ajuda" a taxas insustentáveis em vez de ter procedido a uma reestruturação negociada da dívida. Menos mal que na passada cimeira europeia os juros foram aliviados para valores inferiores a quatro por cento (tal como eu reclamava na minha "chantagem dos três por cento" aqui, aqui e aqui).
Mas por que razão não foram logo propostos a Portugal juros minimamente razoáveis? E quantos milhões e oportunidades terá o nosso país perdido enquanto esperava pelos juros mais baixos saídos da cimeira europeia?
A razão foi que o castigo dos países do sul por via de taxas de juro insanas servia os interesses populistas de Sarkozy e Merkel. Quanto às perdas que Portugal terá eventualmente sofrido, esse é o assunto que menos importa aos actuais líderes da França e da Alemanha.
O timing de um default/reestruturação é um assunto complicado. Quanto mais cedo se procede, menor é o volume de dívida a sofrer reestruturação e menos dinheiro fica por pagar.
Por outro lado, há medida que o tempo passa e as dívidas vão sendo refinanciadas através da ajuda do FEEF/FMI/BCE e eurobonds, vai sucedendo uma alteração na composição dos credores. A dívida deixa de estar tão dispersa por milhares de aforradores privados e passa a concentrar-se num menor número de investidores institucionais.
Ora é muito mais fácil negociar uma reestruturação com um relativamente pequeno número de credores, muitos deles públicos, do que com milhares de anónimos privados. E não é só uma questão de número e de maior cumplicidade entre agentes públicos do que entre instituições e privados: é também importante a maior discrição: uma reestruturação realizada entre governos, instituições europeias e alguns grandes bancos é mais discreta e, logo, menos onerosa do ponto de vista político e eleitoral. É sobretudo esta a razão que tem levado Sarkozy e Merkel a adiarem o mais possível os inevitáveis defaults parciais grego e português.
A concentração da massa de credores tem também o efeito benéfico de minimizar o contágio decorrente do incumprimento parcial e de torná-lo mais previsível.
O adiamento das reestruturações produz ainda um efeito redistributivo: se realizadas agora, quem mais perde é quem mais investiu em dívida soberana; se adiadas, as perdas decorrentes do incumprimento recairão (indirectamente) por maior número de cidadãos uma vez que os perdedores directos são entidades representativas e suportadas pelo grande público (governos e instituições comunitárias).
Vale a pena pensar em quais são os possíveis argumentos políticos e de justiça/equidade que justificam que as perdas em consequência do default parcial sejam socializadas para proteger aqueles que livremente optaram por investir em dívida pública. Questão mais técnica é a da eficiência económica de tal forma de social insurance.
Na minha opinião, apesar de todos os argumentos a favor do adiamento das reestruturações, sou pela sua maior antecipação sobretudo porque os sucessivos endividamentos e bailouts (a Grécia já vai em dois) estão a levar os volumes totais de dívida europeia para níveis que já não permitirão resgate futuro nenhum a menos, talvez, que uma China decida vir em socorro já não de um ou outro pequeno país periférico mas de toda a zona euro.
Há medida que a bola de neve cresce e aumentam as pressões no sentido das dívidas nacionais serem "mutualizadas" pelo conjunto dos Estados membros europeus (cfr. a "novela dos eurobonds" aqui no Albergue), a situação mais ou menos estável de países como a França vai se degradando. Para que a França e a Alemanha garantam a dívida conjunta de Espanha e Itália (mesmo que seja só uma parte) é preciso que os dois primeiros países agravem a sua situação financeira o que os coloca, sobretudo no caso francês, também em risco de precisarem de ajuda. E como dizia o Münchau no outro dia, a França não é suficientemente grande para se resgatar a si mesma.
Enquanto não se travar o ciclo de endividamentos e bailouts, é o próprio conjunto europeu que vai ficando em risco de bancarrota generalizada. Mas a verdadeira preocupação de Sarkozy e Merkel não é a salvação nem de Portugal e da Grécia, nem do euro, nem da União Europeia: é a salvação das próprias cadeiras onde se sentam. Fossem as eleições presidenciais francesas e federais alemãs antecipadas e a política já seria outra. No próximo e último post desta série escreverei sobre o egoísmo eleitoralista de Sarkozy e Merkel.
Como já escrevi várias vezes neste blogue, a reestruturação das dívidas públicas grega e portuguesa é uma inevitabilidade (um primeiro haircut já ocorreu na Grécia e não será o único). Não se trata de uma mera opção económica ou política: é a pressão dos factos que leva a esse resultado.
O facto principal não tem nada de esotérico ou complexo: a quantidade total de dinheiro em dívida já é demasiado grande para que alguém possa acreditar que toda a dívida venha a ser honrada. Logo, os novos credores só emprestam a juros que de tão altos só agravam ainda mais a dimensão do problema. O resultado é uma bola de neve de mais endividamento e sucessivos bailouts que é em si mesmo um fenómeno especulativo dos piores, em que todos sabem que o desastre se aproxima mas todos acreditam que escaparão antes do barco afundar. Só há uma maneira de travar esta bola de neve: o default parcial.
Sendo o default inevitável, o que fica a caber na esfera de decisão política são duas questões importantes: o timing e o modo do default/reestruturação. [A propósito: default parcial e reestruturação são essencialmente a mesma coisa, a diferença é que reestruturação é uma palavra mais soft. O politiquês é a arte de tornar eleitoralmente mais tragável uma mesma e horrível realidade através da utilização de eufemismos.]
O melhor modo de reestruturar é a negociação respeitando minimamente a liberdade dos credores. Reestruturações unilaterais têm consequências políticas e económicas extremamente nocivas e de duração incerta. Uma maneira negociada e que atende à vontade dos credores é a emissão de eurobonds. Como em muitos outros aspectos da construção europeia, existe já um excesso de optimismo em relação aos eurobonds. Parece-me, apesar de tudo, que os eurobonds são um paliativo pelo menos tão bom como outro qualquer, o que já não é nada mau.
Já a questão do timing apresenta maiores dificuldades. Sobre esse tópico, sigam-me até ao próximo post...
Há muitos, muitos anos atrás, o programa de televisão mais visto em Portugal era a telenovela brasileira da Rede Globo que passava por volta das oito e meia da noite. Actualmente, já são poucos os que vêem as telenovelas brasileiras pois as portuguesas tornaram-se as grandes dominantes dos shares e das audiências.
Nesses tempos longínquos, os pais queixavam-se de que os filhos utilizavam cada vez mais expressões e vocábulos brasileiros. Perpassava pelos mais adultos um receio mal definido de que o português se abrasileirava.
Havia uma telenovela em que dois amigos, um dos quais transava com a mãe do outro, se tratavam por "bicho". - Oh bicho! Você está a fim de tomar um chopp com a galera? - Não posso bicho, sua mãe me convidou para um drink.
Havia uma telenovela em que uma personagem de nome Eloá, que vivia aterrorizada pela presença do demónio, chamava "filhotes" aos seus filhos. Nessa altura, em que as famílias portuguesas iam passando de remediadas a classe média à medida que viam os concursos do Carlos Cruz, abriam contas no BCP e compravam casas de férias horrorosas no ainda belo Algarve - nessa altura era chic entre as mães referirem-se aos seus filhos como "filhotes".
Com o predomínio das telenovelas portuguesas, foram-se os filhotes e as transas, foram-se os caras e os drinks. Acho até que já ninguém curte.
As importações linguísticas brasileiras secaram; Portugal ficou menos cosmopolita. É pena.
Como estranha e lamentável compensação, um acordo ortográfico que nem acordo nem vontade nossos recebeu e que de forma tão torpe descaracteriza a escrita do português de Portugal impõe-se-nos agora como facto consumado. Não é nada legal.
Uma possível federalização da União Europeia e o fim de um certo Estado social são outros dois temas que irão acompanhar os europeus nos próximos anos. Este post do Luís Naves sugeriu-me estes dois pensamentos:
A federalização vai ser feita de forma não democrática (nem eleições nem referendos) e, muito provavelmente, pela mera via intergovernamental. E, pior, essa via não vai abranger todos os países. A bicicleta europeia está a ser reduzida ao tandem Sarko-Merkel, o que é péssimo.
Mas o que actualmente se passa na Europa não me parece uma crise do sistema capitalista (e muito menos o fim de uma civilização): é antes (e "apenas") o descalabro de um certo tipo de Estado social: aquele que é baseado no empolar dos funcionários públicos para criar uma classe média; em que se dá mais importância à redistribuição do que à criação de riqueza; em que o eleitoralismo é alimentado por megalomanias sustentadas por dívida e mais dívida; e em que concorrência, mérito e liberdade económica são considerados pecados.
A Europa ocidental e do sul livrou-se dos horrores do comunismo. Os excessos esquerdistas foram, no entanto, muitos. A factura desses excessos está aí para ser paga - pelas actuais e futuras gerações.
A reacção à notação atribuída pela Moody's à dívida pública portuguesa fez-me lembrar a daqueles alunos que depois de prestarem fraquíssimas provas de exame ficam indignados com a classificação atribuída. Vêm depois dizer que não foram examinados na altura correcta, que lhes deveriam ter dado mais tempo para estudarem, que estão a ser objecto de perseguição por qualquer razão, que a escola é má, que o sistema de ensino é péssimo, que não lhes deram condições para terem bons resultados, etc., etc., etc. Naturalmente que eles estão totalmente isentos de responsabilidade pelo fraco resultado que tiveram, o qual foi totalmente devido a esses factores externos.
As reacções dos mais altos responsáveis do Estado a esta decisão da Moody's foram absolutamente despropositadas. O Primeiro-Ministro da Nação não pode dizer que leva "um murro no estômago" quando o país recebe a notação de uma qualquer agência de rating. E muito menos o Chefe de Estado Português pode falar de uma conspiração americana contra os países europeus, em óbvia contradição a anteriores declarações suas sobre o mesmo tema. A notação da Moody's de que o investimento em títulos da dívida pública portuguesa é de carácter especulativo pode ser exagerada, mas não deixa de ter fundamentos em que se baseia. Vejamos quais.
Portugal não cresce há dez anos. Conforme o actual Ministro da Economia referiu aqui, em 2000 a dívida pública portuguesa era de 50% do PIB e hoje ronda os 100%, o valor mais alto dos últimos 160 anos. A dívida externa líquida já ronda os 110% do PIB, tendo a dívida externa total ultrapassado os 230%, os valores mais altos dos últimos 120 anos. O país nos últimos anos não tem parado de viver acima das suas possibilidades, entrando numa espiral de endividamento como um consumidor irresponsável.
Mas perante isto o que fez o Estado Português nestes dez anos? Aumentou sempre sucessiva e de forma louca os impostos, sem nunca cortar na despesa. Em 2000 a taxa máxima de IVA era de 17%. Hoje é de 23%. Em 2000 a taxa máxima de IRS era de 40%. Hoje é de 46,5%. O peso dos impostos que os cidadãos portugueses pagam é absolutamente esmagador e são insustentáveis novos aumentos.
Apesar dessa enorme subida de impostos, o Estado teve sempre que ir procurar receitas extraordinárias para cumprir o défice imposto por Bruxelas. Assistimos com estupefacção à titularização dos créditos fiscais, à aquisição do Fundo de Pensões da CGD, ao lease-back de património do Estado, à transferência do Fundo de Pensões da PT, etc., etc.. Ora, qualquer pessoa com conhecimentos básicos de economia percebe perfeitamente que este caminho não é sustentável. Foi por isso que se tornou imprescindível uma mudança de caminho, e daí a mudança do Governo.
Sucede, porém, que quando se esperava um caminho novo, o que se teve foi mais do mesmo: um imposto extraordinário retroactivo, e por isso inconstitucional. Com a agravante de o Primeiro-Ministro o ter anunciado no Parlamento sem sequer explicar quais as bases legais em que o mesmo assentaria, alegando que tal ainda estava em estudo. Perguntamo-nos se alguém investiria num país em que o Governo pode a todo o tempo anunciar impostos retroactivos sobre os rendimentos, sem sequer se preocupar com o enquadramento legal dos mesmos.
Além disso, o programa do Governo deu claramente a ideia de que se estava a procurar atenuar o rigoroso cumprimento das medidas da troika. As autarquias locais devem ser reduzidas em Portugal? Vamos limitar a redução às freguesias. Deve ser liberalizado o congelamento das rendas, grande responsável pelo endividamento externo do país e pela degradação do parque imobiliário? Procuraremos resolver o problema no prazo de 15 anos, remetendo assim a questão para os nossos sucessores.
Perante isto, há quem se espante por haver agências de rating que colocam o risco de default de Portugal acima do do Paquistão. Alguém já se preocupou em ver se se passam coisas semelhantes no Paquistão?
Sou um leitor atento de algumas revistas de viagens (Volta ao Mundo, Condé Nast Traveller, Viajes, só para citar as minhas preferidas) e não perco a "Fugas" ao sábado no Público. Sempre que posso fazer férias vou para a net procurar toda a informação dos possíveis locais de visita. Sei bem a força das campanhas de promoção turística e como elas influenciam as nossas escolhas. Um bom exemplo que me anda a perseguir desde 2010 é Orlando, Miami e Las Vegas. Estes destinos estão, desde 2010, presentes nas diferentes revistas. Seja com publicidade, seja com reportagens. Uma constante. E dou por mim a "salivar" por uma viagem aos Estados Unidos e a estes destinos muito por culpa dessas campanhas (directas ou subliminares). Porém, terei que trabalhar ainda mais para o conseguir.
Ora, Portugal, é um verdadeiro paraíso turístico por explorar. A Madeira, o Algarve e Lisboa já conseguiram entrar nos principais roteiros das revistas internacionais. Porém, o Douro e o Alentejo, o Minho e o Porto, necessitam de um esforço suplementar em termos de investimento em campanhas promocionais fora de portas. O destino Porto e Norte de Portugal continua a crescer mesmo em tempos de crise. A estada média dos turistas é que continua a ser baixa (1,6 dias) e o esforço do Turismo do Porto e Norte de Portugal, digno de registo e estudo, mesmo estando, como está, a fazer verdadeiros milagres fruto de muitas omoletes com tão poucos ovos, necessita de ter mais apoios para campanhas promocionais (sobretudo em Espanha, Inglaterra, Estados Unidos, Brasil, paises nórdicos e nos principais mercados emissores da Ásia). Neste momento, temos inúmeros investidores privados a construir hotéis em todo o Norte e temos produtos excepcionais. É hora de aproveitar o crescimento presente, de apanhar a boleia da promoção que deriva do Vinho do Porto, da exposição mediática do F.C. Porto, da aposta da Ryanair e das potencialidades gastronómicas, culturais e patrimoniais de toda a Região.
Espero que o novo Governo olhe para o turismo como ele é: uma das poucas industrias em que vale a pena apostar e investir. Que olhe para o esforço que o TPNP está a realizar e para todos aqueles que estão a investir no turismo da região, fomentando a riqueza, criando postos de trabalho e, pelo caminho, aproveite para analisar este estudo encomendado pela U.S. Travel Association.
Portugal não pode parar e este é um dos caminhos para a mudança.