Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Legislativas (20)

 

Cinco perguntas que faço a mim próprio como eleitor

 

1. Lembras-te qual foi o político que em 2005 prometeu pôr Portugal a crescer 3 por cento ao ano, criar 150 mil postos de trabalho e aumentar a convergência entre o nível de vida porutuguês e a média europeia?

 

2. É-te indiferente seres governado por alguém que falta reiteradamente à verdade?

 

3. Vives melhor ou pior do que vivias em Setembro de 2009?

 

4. Vives hoje num país mais prestigiado, mais livre e mais soberano do que vivias em Setembro de 2009?

 

5. Em consciência, entendes que o actual chefe do Governo merece continuar como primeiro-ministro de Portugal?

Democracia Verdadeira = Populismo do Pior (3/3)

Os exemplos de manipulação e sequestro da linguagem são numerosos e constituem uma ferramenta de controlo e desinformação. (...) Nós, cidadãos, perdemos o respeito pelos partidos políticos maioritários (...). [Do manifesto da "Democracia Verdadeira"].

 

Que hipocrisia! Então estes tipos que se queixam da "manipulação e sequestro da linguagem" não têm vergonha de realizar eles mesmos esse tipo de manipulação? Perder o respeito pelos partidos políticos maioritários equivale a perder o respeito pelo voto das pessoas que escolheram esses partidos. Porque é que não o dizem explicitamente? Sejamos claros: o que eles não têm é respeito pelas pessoas que votam de tal forma. E que forma é essa?

 

6. Democracia Verdadeira significa dar nome à infâmia em que vivemos: Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu, NATO, União Europeia, as agências de notação financeira (rating), como a Moody’s e a Standard and Poor’s, o PS, PSD, CDS (...). [Mesmo linque, bold meu].

 

Portanto, o meu voto só merece respeito desde que eu não vote no PS, PSD e CDS. Votar nos que se lamentam pelo fim da União Soviética e que não vêem razões para classificar a Coreia do Norte como uma não-democracia: aí sim, o voto já merece todo o respeito. Votar em padrecas trotskistas moralistas: aí sim, o voto já tem dignidade.

 

10. Não apelamos à abstenção. Exigimos que o nosso voto tenha uma influência real na nossa vida.

 

Inconsistente: primeiro dizem que o voto é inócuo e que os cidadãos têm uma "participação eleitoral nula". Depois já dizem que são contra a abstenção e a favor do voto. O que eu acho que eles, realmente, desejam é que o voto no PS, PSD e CDS passe a contar como voto em branco e o voto em partidos de esquerda conte a dobrar, ou a triplicar se for na esquerda hiper-radical.

 

Finalmente, há aqui uma sinceridade que convém registar:

 

um evento capaz de abrir novos sentidos às nossas acções e discursos. Isto nasce da RAIVA. Mas a nossa RAIVA é imaginação, força, poder cidadão.

 

Atenção que aquelas letras maiúsculas não são minhas: fazem mesmo parte do manifesto.

 

Qual é então o melhor e mais adequado sentimento em que se deve basear um regime e mobilizar uma democracia? Raiva! É preciso ainda escrever mais alguma coisa para se perceber a verdadeira essência desta "Democracia Verdadeira"?

 

 

A democracia portuguesa, liberal, eleitoral, representativa, parlamentar, formal, substancial, que fique de olho: o que está ali acampado no Rossio não é nada de bom. E, em definitivo, não tem nada de democrático: é populismo do pior.

Democracia Verdadeira = Populismo do Pior (2/3)

3. A democracia promovida a partir dos corruptos aparatos burocráticos é, simplesmente, um conjunto de práticas eleitorais inócuas, em que os cidadãos têm uma participação nula. [Manifesto da "Democracia Verdadeira" aqui].

 

Em toda a minha vida nunca tinha assistido em Portugal a um ataque tão directo e tão declarado à democracia. E não me parece que seja ingénuo. Isto ao mesmo tempo que se diz promover a democracia. Nem Salazar teria tanto descaramento! Práticas eleitorais inócuas? Então votar não serve para nada? Os cidadãos têm participação nula? Quer isso dizer que os cidadãos estão impedidos de votar? Pensei que a única coisa que impedia os cidadãos de votar era o seu próprio desinteresse e alheamento!

 

Curiosamente, falando de desinteresse e alheamento, são os próprios "democratas" daquele manifesto a confessarem "muitos anos de apatia":

 

1. Depois de muitos anos de apatia, um grupo de cidadãs e cidadãos (...) reuniram-se, no Rossio, em torno da ideia de Democracia Verdadeira. [O mesmo linque].

 

Ainda que mal pergunte... mas porque é que estes "democráticos" se mantiveram apáticos durante os anos de governo socialista e só se lembraram de deixar a apatia de lado quando finalmente tudo indica que a direita regressará ao poder em Portugal (e em Espanha)? O activismo só lhes dá na guelra quando é contra a direita? Pois é: estes democráticos apáticos trazem consigo o velho e mesmo preconceito: esquerda é democracia, direita não é democracia; quanto mais extremista, mais democrática é a esquerda. Enfim, nada de novo...

 

A "Democracia Verdadeira" é, isso sim, igual a populismo do pior. Em Portugal há partidos e até são bem variados (só alguém de direita é que se poderá queixar de falta de variedade). O espectro partidário é ainda bem extenso: inclui partidos moderados e partidos extremistas. A escolha, portanto, não é nada pouca.

 

Se o voto nos partidos não serve e não é democracia, a "democracia verdadeira" será então o quê? Milícias? O poder entregue ao primeiro parvalhão que se apodera do megafone ou que sobe a um poste e é capaz de berrar mais alto do que os outros?

 

Democracia não é mob rule. O regime precisa de se defender das ameaças oclocráticas. E os portugueses (e espanhóis) têm experiência histórica suficiente para saber em que é que as oclocracias acabam. Mas, é claro, experiência histórica não é o mesmo que cultura, conhecimento históricos.

 

Para além do conhecimento e compreensão da História, é evidente que em Portugal faz falta uma cultura democrática que não seja miserabilista, isto é, que seja um bocadinho aprofundada. A miséria da escola pública tem também destas consequências: nem a gente diplomada parece compreender com um mínimo de profundidade o que é a democracia. Faz falta cultura e estudo políticos e históricos e económicos. Mas a sério.

Democracia Verdadeira = Populismo do Pior (1/3)

Este é um tempo de manifestos e mais manifestos. Quanto pior é a realidade e quanto mais difícil é aceitá-la, mais manifestos são escritos. As mudanças de que Portugal necessita não são agradáveis. Para quem se mantém no estado de negação da realidade, palavras, manifestos e cantiguinhas sabem melhor do que as acções determinadas (aqui).

 

Há cerca de dois meses atrás, a propósito de uma desculpa esfarrapada da parte de Sócrates, Vasco Pulido Valente explicou e bem a importância dos aspectos formais da democracia:

 

A democracia é “forma”. Só as ditaduras se justificam pelo “conteúdo”. (...) A democracia (...) exige que se respeite a “forma”, que em última análise legitima qualquer decisão política. (...) Mas, se por acaso se puser em dúvida a “forma” do regime, não há maneira de fundar o menor acto de Governo, excepto no “conteúdo” que um ditador, inevitavelmente sustentado pela força, à altura lhe resolver dar. [Bold meu, texto completo aqui].

 

Julgo que nos tempos mais próximos vai ser muito necessário ter presente e, eventualmente, explicar a importância das componentes formais da democracia. E, desta vez e para variar, essa explicação não terá de ser dada à classe política nacional - mas ao próprio povo. Uma lição de democracia faz falta, por exemplo, aos signatários do manifesto da "Democracia Verdadeira".

 

Um movimento de protesto

Em Espanha, a dias das eleições regionais, estalou um movimento mobilizado pelas redes sociais (Democracia Real, Já, ou 15-M, para abreviar), que encheu as praças centrais de várias cidades com milhares de pessoas em protesto. Este movimento tem carácter populista e é no fundo muito semelhante ao seu homólogo americano, o Tea Party, embora aqui tudo esteja ao contrário na imagem do espelho, recebendo a compreensão da esquerda e a perplexidade da direita.

Nos últimos dias, o PSOE tenta fazer um despudorado aproveitamento destas manifestações e o primeiro-ministro chegou a dizer que se tivesse 25 anos se juntaria ao protesto, como se não tivesse governado a Espanha durante quase oito anos.

Tudo indica que o movimento pacífico estará activo amanhã, dia de reflexão eleitoral, no que equivale a uma verdadeira rebelião.

 

As manifestações consistem num acampamento e têm uma espécie de RGA (lembram-se, na escola, como estas funcionavam?) onde alguns dirigentes improvisados falam, sem que ninguém perceba o que se passa, para aplauso de todos, acabando por serem aprovadas "decisões" onde a massa não teve qualquer participação. Estas reuniões de massas são totalmente controladas por uma minoria muito activa que, a prazo, se fará eleger como representante de todo o protesto.

E o que está a ser aprovado? É tudo muito difuso. Os manifestantes querem impôr uma lei de participação cidadã cujos contornos não se conhecem. Dizem que os votos brancos devem ser contabilizados e que não pode haver candidatos com processos nas listas eleitorais; finalmente, a defesa de mais referendos. Alguns dirigentes dizem que não são "apolíticos, mas apartidários", e o protesto visa claramente os dois maiores partidos, sobretudo o PP, mais à direita, e que deve (devia) vencer as eleições. O argumento principal dos manifestantes é o da "indiferença perante a política".

 

Apesar de ser necessário dar o desconto das tradições anarquistas espanholas, julgo que a natureza profunda do 15-M esconde uma perigosa tendência, cada vez mais visível nas democracias ocidentais: a fragmentação populista. Quando os eleitorados começam a mudar de partido em grandes oscilações, como aconteceu na Finlândia, é tempo para as elites se preocuparem; por outro lado, a minorias activas começam a tomar como refém as organizações; é o que se passa na América, onde a chantagem exercida pela minoria do Tea Party está a impedir o normal funcionamento do Congresso. Como se o Tea Party, que ajudou apenas a eleger seis senadores republicanos e uma dezena de representantes, tivesse ganho as eleições de Novembro. Mas podia dar outros exemplos (Dinamarca, Holanda, França, Itália). A demagogia e o populismo compensam no discurso político, assim como os argumentos anti-capitalistas e a recusa da solidariedade entre países ou entre regiões ou entre classes sociais ou entre gerações. O Tea Party demoniza os europeus; os demagogos europeus fazem o inverso e demonizam a América.

 

Tudo isto, suponho, terá a ver com o medo que domina as sociedades contemporâneas: receio do cataclismo ou premonição da decadência; temor do desemprego e da penúria; pavor da queda social e da exclusão; sobretudo o fantasma do envelhecimento. Num mundo onde se glorifica a juventude, um certo tipo de beleza, onde se combate a cultura e se despreza a inteligência, onde se procura a fama e a riqueza a qualquer preço, as pessoas parecem precisar de novas causas, que estimulem o orgulho de pertencer a algo distinto e vencedor.

É por isso que esta crise, lenta como o esboroar da pedra, é tão diferente da dos anos 30. Então, existiam ideologias rivais, o comunismo e o fascismo. Era um mundo mais nítido. Agora, após a morte das ideologias, num mundo onde os valores são egoístas, é difícil manter a lucidez.  

 

Para mais, a comunicação social (e agora as redes sociais) amplificam estes movimentos de protesto difuso. As redes sociais podem ser úteis para uma democracia, mas também facilitam o populismo. Elas tendem para o vazio de conteúdo e as televisões são hoje dominadas pela ditadura das audiências. Os próprios partidos democráticos já conduzem as suas estratégias levando em conta as sondagens. Não falar disto, não dizer a verdade toda, evitar o tema fracturante que nos faz perder votos. O marketing moderno é a busca daquele imenso território do mínimo denominador comum.

Por tudo isto, acho que os movimentos populistas ao estilo do 15-M estão condenados a crescer e multiplicar-se. A democracia que conhecemos será combatida sobretudo desta forma, a partir do incómodo geral que os povos sentem, uma espécie de comichão superficial que alimenta a sua ansiedade. É ao mesmo tempo contestação das elites e aceitação de uma ordem mais inflexível e menos liberal. As minorias vão impor as suas visões estreitas em referendos, cujas discussões favorecem os que gritam mais alto. Haverá mais proporcionalidade nos votos e, por isso, maior fragmentação de partidos, com instabilidade governativa, liberdade para os grupos de pressão ganharem influência, divisões mais óbvias e profundas entre as pessoas. Os sinais da radicalização do nosso tempo e da doença democrática estão em Madrid. 

Crise Política? Qual Crise Política?

Os jornais referem hoje "crise política" para aqui, "crise política" para ali, "crise política" para acolá. Mas qual "crise política"? Um primeiro-ministro demitiu-se, o Presidente da República tomará as decisões adequadas, as instituições mantêm-se a funcionar, et cetera, et cetera, et cetera. Portugal tem uma constituição que é aplicada, pelo menos ao nível da articulação institucional. A constituição é respeitada, a democracia funciona - qual é então essa "crise política"? Um primeiro-ministro sai, outro (ou o mesmo) entrará, eventualmente a composição do parlamento mudará. Tudo dentro dos trâmites normais.

 

Não existe, portanto, crise política nenhuma. Existe sim uma democracia e uma constituição a funcionarem regularmente, indicando as vias formais estabelecidas para renovar um governo. Nada de especial, portanto.

Propagação Democrática

Na vaga de manifestações e tentativas de revolução que percorre o mundo muçulmano, aquilo que mais me surpreende é o contágio. Não era necessário que uma manifestação em Tunes se propagasse ao Cairo. Mas isso aconteceu: de umas cidades para as outras, foi-se formando uma linha de união entre os diversos países islâmicos.

 

A unidade entre países normalmente não é óbvia. A consciência colectiva das semelhanças entre países nem sempre existe mesmo quando essas semelhanças, vistas de fora, parecem evidentes. Em geral, sucede o contrário: o nacionalismo e o sentimento exacerbado de identidade e de diferença tendem mais a ser a regra do que a excepção. E, no entanto, aquelas diferentes nações muçulmanas foram seguindo o exemplo de umas para as outras.

 

Qual o mínimo de características e causas comuns necessário à propagação internacional da revolta democrática? Foi necessário um mesmo sentimento difuso de insatisfação económica e política, desemprego elevado, população jovem, informatizada e internetizada, subida de preços, língua e religião essencialmente comuns? Ou bastava menos do que isso tudo?

 

Se o mínimo necessário à propagação da democracia for pouco exigente, talvez possamos esperar que a revolta democrática se extenda, por exemplo, a Angola e a tantas outras não-democracias. Mas será que os angolanos, ou outros, podem sentir-se suficientemente próximos das nações muçulmanas, de modo a deixarem-se influenciar e seguir o exemplo? (Como, aparentemente, a América Latina se sentiu relativamente a Portugal e Espanha na transição para a democracia).

 

Será que a ausência de instituições democráticas e a falta de oportunidades são suficientes para criar um sentimento de irmandade que funcione como canal de propagação da revolta democrática, alargando-a para além das fronteiras linguísticas, culturais e religiosas?

 

Seria bom que fossem.

 

Excursionista me confesso

Em Cachimbo de Magritte habituei-me a ler um blogue onde se pensa. Mas em relação à crise egípcia, alguns dos autores locais têm andado aos papéis, ainda por cima desvalorizando opiniões diferentes das suas com truques de retórica, sobretudo mudando de posição em cada dia e acusando outros de inconsistência. Falo das reacções à minha posição sobre o tema, ou à do Pedro Correia, mais abaixo, interpretando-as como tontas capitulações ocidentais perante o perigo iminente das hordas bárbaras. Uma crítica minha na caixa de comentários recebeu uma resposta intrigante, daquelas que alguns costumam dar a tolos ignaros.

Outro autor do mesmo blogue, Carlos Botelho, diz que tem cautelas e escreve isto, mas suponho que, depois do que tem escrito, deverá manifestar no futuro alguma dificuldade em opinar sobre o Irão. O mesmo autor faz um post com uma imagem de Hitler a conversar com o grande mufti de Jerusalém, em 1944, numa referência às crises no Médio Oriente, mas infelizmente não explicando o seu ponto.

Julgo que estas leituras dão que pensar.

 

Os intelectuais portugueses perante o Egipto

 

A intelectualidade portuguesa nunca dispensou a sobranceria. E tem outra característica, um enorme desprezo pelo povo. Estes dois elementos contaminam geralmente a sua visão do mundo. Ela é sobranceira e elitista. Esqueci-me de outro aspecto: os intelectuais portugueses dificilmente aceitam uma crítica.

 

Escrevo este post depois de visitar um blogue onde costumo ler alguns excelentes autores. Tentei entrar numa discussão na caixa de comentários, acho que escrevi coisas óbvias, mas esbarrei num muro de incompreensão e fui corrido a deselegâncias.

O tema era o Egipto e a forma como de repente uma série de comentadores portugueses (ao arrepio do que se lê em jornais de todo o mundo) decidiu que a revolução egípcia é má e anuncia coisas terríveis. Uma catástrofe, isto de um povo querer ditar o seu destino. A ideia vem geralmente associada a um sub-enredo segundo o qual qualquer pessoa que aprecie os acontecimentos é um idiota sem cura.

 

Num plano mais sério, um autor como Vasco Pulido Valente escreve isto:

 

"Não percebo por que razão os políticos divagam e os jornais se entusiasmam. Não chegou o delírio democrático depois da queda do muro e do colapso da URSS, para perceber que uma insurreição popular não leva forçosamente a uma democracia?" (tirei do blogue do João Gonçalves, onde podem ler o texto completo)

O autor vai por ali fora: a democracia é impossível no Egipto por haver muita miséria, pobreza, ignorância. Não há partidos nem instituições, não haverá elites, os radicais vão tomar o poder e até o Irão vai ajudar à festa. No fundo, aceita-se que a crise do Médio Oriente é como uma queda do muro de Berlim, mas o resultado será necessariamente pior do que aquilo que existia. Portanto... Bem, a partir daqui, a tese é um pouco mais confusa.

 

A Hora da Liberdade

Quando olho para o que se passa na Tunísia e no Egipto fico moderadamente optimista. Um optimismo fundado no que vi e ouvi dos manifestantes muçulmanos em Londres, uma vontade genuína de Liberdade.

 

 

 

 

 

Ingenuidade minha? Talvez. O que querem, por exemplo, os muçulmanos egípcios e tunisinos que vivem em Inglaterra e que estavam na manifestação pelo fim das ditaduras no mundo árabe? O mesmo que os seus irmãos em França, na Alemanha ou nos EUA: uma vida melhor para os seus na sua terra. Sem entrar em grandes filosofias ou teorias políticas: querem comprar um bom carro, comer em restaurantes, ir ao cinema, ter um iPhone e navegar na internet. Querem ter aquilo que nós temos e que muitas vezes nem damos o devido valor tal a forma como o nosso estilo de vida se generalizou na nossa sociedade. Eles querem viver.

 

 

 

 

 

E esse querer, fundado na sua experiência de vida no mundo ocidental, deve-nos obrigar a ajudar a que assim seja e a melhor ajuda que podemos dar é a nossa abstenção construtiva. Ou seja, não interferir, não voltar a ter tiques imperialistas. O lado mais fundamentalista e radical do islamismo só pode ser combatido pelos muçulmanos moderados. É uma batalha entre irmãos, entre homens e mulheres do Islão. A interferência, constante, dos principais actores políticos ocidentais deu sempre asneira e prejudicou os moderados em favor dos radicais. Será que já aprendemos a lição da história?

 

Obviamente, o perigo de um assalto ao poder por parte dos radicais existe mas os jovens e as mulheres que protestam na rua contra a ditadura fazem-no por uma genuína vontade de mudança e um objectivo claro de liberdade e esta adquire-se lutando e perde-se se imposta de fora para dentro.