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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Renovar a análise política

 

A propósito das recentes legislativas, não faltou quem desenterrasse uma frase proferida por Francisco Sá Carneiro em 1979, num contexto muito diferente do actual: "Um governo, uma maioria, um presidente." A frase deve situar-se à época: Portugal tivera 11 governos em escassos cinco anos, não produzira nenhuma maioria parlamentar estável desde a entrada em vigor da Constituição de 1976 e necessitava com urgência de reformas políticas profundas - com destaque para o fim do Conselho da Revolução como tutela militar das instituições civis, algo aberrante na Europa Ocidental.

Sá Carneiro e os seus sucessores políticos imediatos cumpriram estas metas: dotaram o País pós-revolucionário da primeira maioria parlamentar sólida e alcançaram um acordo político com o PS que possibilitou a revisão constitucional de 1982, pondo fim ao Conselho da Revolução após sete anos de existência e reduzindo os poderes discricionários do Presidente da República em benefício do Parlamento, em sintonia com a esmagadora maioria dos países da Europa comunitária.

O fundador do PSD não sonhava com um país político monocolor: pretendia, isso sim, que as sérias divergências institucionais que manteve com o presidente Ramalho Eanes (divergências que partilhou com outros primeiros-ministros, como Mário Soares e Pinto Balsemão) fossem dirimidas com o reforço da componente parlamentar no singular sistema político português. Foi um combate que travou com frontalidade, em prol do que entendia serem os interesses nacionais.

Passos Coelho nunca utilizou esta expressão nem faria qualquer sentido recorrer hoje a ela, fosse qual fosse o inquilino de Belém. Nem Cavaco Silva é apropriável por esta maioria nem o Presidente terá certamente a ilusão de que influenciará a actividade governativa fora dos estritos limites que a Constituição lhe impõe. Por outro lado, a maioria de que Passos dispõe no Parlamento está longe de ser monocolor: PSD e CDS são partidos autónomos, com programas políticos diferenciados e estratégias muito próprias, como hoje ficou bem patente na falhada eleição de Fernando Nobre para a presidência da Assembleia da República.

Basta o que referi para esvaziar de sentido esta frase no momento actual. Deixemo-la no contexto histórico a que pertence e tentemos interpretar os factos sem o recurso a fórmulas gastas. Aliás não é só a política que necessita de renovação: a análise política também.

 

Foto: António Ramalho Eanes e Francisco Sá Carneiro em 1980

O Casamento

Uma coligação política é assim uma espécie de casamento. Para o bom e para o mau.

 

O CDS não gosta de Fernando Nobre. Está no seu direito. Eu também não apoiei Fernando Nobre nas presidenciais.

Até posso ter algumas reticências quanto à escolha. Posso. Mas estes não são tempos para limpar armas. O CDS e alguns, poucos, deputados do PSD não perceberam. A sorte deles (e nossa) é que o país está de tal forma que este é o menor dos nossos problemas. Agora.

 

Mas fica para memória futura.

Assim não!

As declarações de Ana Gomes, hoje, sobre Paulo Portas são um perigo.

 

Todos conhecem as minhas opiniões e posições críticas sobre Paulo Portas. É com esse cartão de visita que tenho, entendo, moral para criticar o que Ana Gomes fez. As acusações da eurodeputada socialista fundamentam-se em quê? Existem provas do que afirma? Foi Paulo Portas condenado judicialmente? Caso contrário, estamos perante um ataque pessoal de uma gravidade sem paralelo.

 

Ou Ana Gomes prova o que afirma ou, espero, Paulo Portas e o CDS terão de agir judicialmente. E já.

 

O novo Governo ainda nem foi feito e já começam os ataques pessoais. Assim não!

Noite de legislativas (5)

José Sócrates e Paulo Portas saudaram publicamente o vencedor da noite, Pedro Passos Coelho. Outros dois líderes partidários, Francisco Louçã e Jerónimo de Sousa, não o fizeram - pelo menos que eu tivesse ouvido em directo nas televisões. Há pequenos gestos que dizem muito sobre o espírito democrático dos políticos e sobre a forma como encaram o veredicto popular expresso nas urnas.

 

ADENDA: Leitor atento informa-me que Louçã dirigiu parabéns ao vencedor. Fica feita a rectificação.

Legislativas (16)

 

CENTRO DEMOCRÁTICO SOCIAL: MEDIDAS EMBLEMÁTICAS

(para ler e comentar)

 

Programa eleitoral do CDS-PP 

Título genérico: Este é o momento

Número de páginas: 72

Data de apresentação: 14 de Maio de 2011

Frase-chave: «Promover o elevador social, ou seja o direito a subir na vida legitimamente através da educação e do trabalho.»

 

1. Sanear as finanças públicas.

2. Imposição de limites ao endividamento na Constituição da República.

3. Redução do número de gabinetes do Governo e "cortes muito concretos nas despesas de aquisições de bens e serviços como comunicações, publicidade, eventos e assessorias".

4. "Revisão da lista dos cargos de confiança política".
5. Fusão ou extinção de empresas públicas, institutos públicos, fundações e grupos de missão do Estado no prazo máximo de 90 dias.

6. Programa de rescisões por mútuo acordo na Administração Pública.

7. Redução dos membros dos conselhos de administração das empresas públicas.

8. "Revisão rigorosa do regime de remunerações dos gestores públicos", com a imposição de um tecto máximo para as remunerações fixas.

9. Nova autoridade da concorrência, concedendo ao Presidente da República responsabilidades na nomeação dos reguladores.

10. Reduções fiscais às pequenas e médias empresas que cumpram objectivos de crescimento e de exportação.

11. "Ganhos de produtividade das empresas devem reflectir‐se numa compensação no nível salarial do trabalhador".

12. Reforma profunda do IRS no sentido da sua simplificação, "de forma a promover o valor da mobilidade social e avançar, progressivamente, para um IRS mais amigo da família e atento ao número de filhos".

13. Um IRS com menos escalões, menos taxas e menos excepções.

14. Redução da Taxa Social Única.

15. Incrementar uma "política de segurança firme, que responsabiliza o criminoso, apoia a vítima e ajuda e liberta a sociedade de demasiada violência".

16. Aumento de penas por crimes de fraude fiscal, nomeadamente em burlas tributárias e associações criminosas e fraudes qualificadas.

17. Criação de uma "bolsa de juízes de acção rápida" para a resolução de "atrasos crónicos" nos tribunais.

18. Criação de um Conselho Superior do Poder Judicial para substituir os actuais Conselho Superior da Magistratura e Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

19. Assessorias técnicas nos tribunais para libertar os juízes de tarefas administrativas.

20. Ministério da Administração Interna com poderes reforçados sobre a política penal, processo penal e execução de penas e prisional, matérias actualmente da competência do ministro da Justiça.

21. Ministério das Finanças deve agregar parte das actuais competências do Ministério das Obras Públicas.

22. Adiar novo aeroporto de Lisboa e modernizar aeroporto da Portela.

23. Suspensão do TGV.

24. Reafectação dos fundos comunitários do TGV e do novo aeroporto para novos projectos de pequena dimensão e que fomentem a coesão territorial.

25. Reavalização das parcerias público-privadas.

26. Extinção dos governos civis.

27. Revisão do Rendimento Social de Inserção, com regras mais apertadas para sua a atribuição e fiscalização.
28. Actualização das pensões mínimas, sociais e rurais ao nivel anual da inflação.

29. Reabilitar o mercado de arrendamento.

30. Agilizar os prazos para as acções de despejo.

31. Regenerar os bairros sociais.

32. Criar Rede Nacional de Cuidados Paliativos.

33. Generalizar a prescrição de medicamentos por unidose.

34. Aprovação de uma lei do testamento vital.

35. Dar mais autonomia às escolas e mais autoridade aos professores.

36. Revisão curricular, com a introdução de mais aulas de portugues e matemática no ensino básico.

37. Introdução de exames nacionais de final de ciclo no ensino secundário.

38. Criação de bolsas de empréstimos de manuais escolares.

39. Valorização do ensino profissional.

40. Defesa dos contratos de associação entre as escolas privadas e o Estado.

41. Ligação das escolas às empresas com a criação de um um Indice de Empregabilidade que torne "tão transparente quanto possível a ligação oferta-procura de qualificações".

42. Definir o estatuto de micro-empresário para "salvaguardar aqueles que querem criar valor, através de um negócio".

43. Negociação da reforma da Política Agrícola Comum.

44. Elaboração de um cadastro florestal.

45. Criação de mecanismos de segurança e de gestão de riscos, com o apoio da União Europeia, para reduzir os incêndios florestais.

46. Manutenção da Caixa Geral de Depósitos sob controlo do Estado português.

47. Manutenção de um canal público de televisão visando "obrigações de interesse nacional", nomeadamente a defesa e promoção da língua portuguesa.

48. "Avaliação criteriosa" dos apoios à expressão artística e às fundações.

49. Dignificação dos deficientes das Forças Armadas e dos antigos combatentes.

50. Reinventar e promover a marca Portugal.

Legislativas (10)

  

 

DEBATE PAULO PORTAS-FRANCISCO LOUÇÃ

 

Francisco Louçã e Paulo Portas protagonizaram esta noite, na SIC, o mais equilibrado dos debates televisivos desta campanha. Foi um debate em que ficaram evidentes as clivagens ideológicas mas sem crispações pessoais. O presidente do CDS-PP e o coordenador do Bloco de Esquerda, ambos com longa experiência em televisão, souberam dirigir-se aos seus eleitorados específicos - jovens, desempregados e pensionistas sociais, no caso de Louçã; idosos, agricultores e portugueses da classe média-baixa, no caso de Portas. Louçã foi hábil ao associar por duas vezes o seu antagonista ao primeiro-ministro. "O seu programa é hoje o do engenheiro Sócrates", acusou o bloquista, lembrando que Portas apoiou o memorando assinado entre o Governo e o triunvirato composto por membros da Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu. "O responsável pela situação a que Portugal chegou chama-se José Sócrates", demarcou-se Portas, acentuando que aprovou o memorando por absoluta falta de alternativa: "Uma declaração de insolvência do Estado português significava que Portugal era posto fora do euro e que o dinheiro das pessoas ficava a valer metade."

Portas aproveitou o início do frente-a-frente para detalhar algumas das medidas que propõe aos eleitores. Nomeadamente a concessão de um crédito fiscal às empresas que contratem novos trabalhadores neste tempo de recessão e a obrigação de as universidades avisarem os alunos para os índices de emprego dos seus cursos. Louçã também foi capaz de descer ao concreto, advogando a "criação de emprego com o impulso do Estado" na ferrovia de proximidade, em novas redes de lares de terceira idade e na reabilitação urbana. Trocaram argumentos fortes em questões como o emprego, o rendimento mínimo e a renegociação da dívida externa portuguesa. Portas aproveitou para criticar Louçã por ter recusado uma audiência com os membros do triunvirato que se deslocaram a Lisboa: "As suas ideias, deixou-as nas mãos de José Sócrates. Porque teve medo de perder votos para o Partido Comunista." Louçã deu-lhe o troco, acusando-o de "conseguir votos" à custa da diabolização dos beneficiários do rendimento mínimo, "degradando a cultura da solidariedade". E, tal como fizera no debate com Paulo Portas, voltou a mencionar o ex-ministro democrata-cristão Bagão Félix entre os que defendem a renegociação da dívida. Sem esquecer outras personalidades distantes da sua área ideológica que já exprimiram a mesma tese, como Pedro Ferraz da Costa e "o seu antigo primeiro-ministro, Santana Lopes". Palavras ditas olhando Portas com um sorriso irónico.

O presidente do CDS, mais contido do que é habitual, não hesitou em mencionar áreas de convergência com o Bloco: "Ambos votámos a favor da prescrição da unidose", acentuou. Também ele defende a "Caixa Geral de Depósitos pública", estando nesta matéria mais próximo de Louçã do que do PSD. Não deixou, aliás, de marcar distâncias em relação a Passos Coelho num cenário de uma coligação pós-eleitoral PSD-CDS. Passos só a aceita se os sociais-democratas forem os mais votados, Portas defende-a mesmo que o PS fique em primeiro nas urnas mas os dois partidos mais à direita consigam formar maioria aritmética no Parlamento.

"Os indecisos têm que votar. Eles farão a força da democracia", concluiu Louçã. Portas pareceu de acordo. Não restavam dúvidas: este debate serviu aos dois.

 

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FRASES

Louçã - «A criação de emprego tem que puxar pela economia no seu todo.»

Portas - «O primeiro-ministro que ainda nos governa tinha prometido criar 150 mil postos de trabalho.»

Louçã - «Todas as medidas que afundam a economia criam desemprego.»

Portas - «O senhor não pode enganar-se com quem está aqui. Não está aqui ninguém que congelou pensões.»

Louçã - «Paulo Portas é o único português, junto com o engenheiro Sócrates, que acha razoável pagar 30 milhões em juros.»

Portas - «O doutor Francisco Louçã não foi capaz de falar nem com o FMI, nem com o BCE, nem com a UE. Quando o meu país está à beira da insolvência, eu não fico quieto.»

Louçã - «O doutor Paulo Portas tem muito pouco respeito pelos adversários. Não me acuse de ficar quieto.»

Portas - «A renegociação da dívida não é solução.» 

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ADENDA

Por curiosidade, recordo o que escrevi sobre o debate Paulo Portas-Francisco Louçã da campanha legislativa de 2009.

Legislativas (6)

 

 

DEBATE PAULO PORTAS-PEDRO PASSOS COELHO

 

O presidente do PSD perdeu esta noite uma excelente oportunidade de invocar algumas bandeiras sociais do seu partido perante os eleitores indecisos que o escutavam. E a ocasião era até propícia para o efeito: Pedro Passos Coelho tinha pela frente, no estúdio da SIC, o líder do partido situado mais à direita no hemiciclo de São Bento. Passos preferiu, no entanto, falar de temas macro-económicos: poupança do Estado, receita adicional dos cofres públicos, taxa social única, crescimento económico, criação de emprego, um "esforço adicional" dos portugueses para a diminuição do défice das nossas contas. Questões importantes, sem dúvida. Mas insuficientes para quem esperaria do principal partido da oposição uma olhar menos economicista sobre os problemas que afligem o País. Paulo Portas, que recentemente se gabou de liderar um partido situado "à esquerda" do PSD em preocupações sociais, tinha razões para estar satisfeito quando Clara de Sousa deu por concluído o debate.

Portas e Passos mostraram-se cautelosos ao longo deste frente-a-frente. Sabendo que existem fortes probabilidades de coexistirem num governo a empossar por Cavaco Silva após as legislativas de 5 de Junho, mostraram uma notável contenção verbal que em certos momentos roçou a monotonia. José Sócrates, adversário de ambos, esteve mais ausente deste debate do que se esperava. E nos escassos minutos de real despique político a iniciativa coube quase sempre ao presidente do CDS-PP, certamente animado pelas sondagens. "Temos visto o PSD variar em muitos assuntos muito depressa", afirmou Portas, ironizando acerca da "enésima versão do PSD sobre a taxa social única" ou as posições erráticas que os sociais-democratas têm assumido em matéria fiscal. "O senhor já uma vez teve que se desdizer quando disse que não aumentava impostos", lembrou. E foi ainda mais incisivo ao apontar o dedo crítico ao partido laranja em questões agrícolas: "A política do PSD para a agricultura, nos últimos anos, foi um deserto."

Passos, aparentando mais calma do que o seu interlocutor, aludiu a uma maioria absoluta em que nem sequer no PSD já ninguém parece acreditar: na sua opinião, "não é irrealista" que os eleitores dêem aos sociais-democratas "as mesmas condições que deram ao PS no passado". Nenhum estudo de opinião sustenta tal tese. O presidente laranja sabe, portanto, que uma coligação com os democratas-cristãos constitui o maior seguro de vida política pós-eleitoral para o partido que lidera. Daí talvez a excessiva bonomia com que tratou Portas. Noutros tempos, com outros líderes, este jamais teria sido um debate entre iguais. Mas o PSD já não é o que era. E o CDS também não. Algo se vai movendo no aparente imobilismo da política portuguesa.

 

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FRASES

Portas - «As pessoas estão preocupadas em soluções para o País e não em tricas entre os políticos.»

Passos - «Um governo PS-CDS-PSD seria uma salada russa.»

Portas - «O PSD não fez o suficiente para ser premiado com o voto.»

Passos - «O programa desenhado pela troika é o preço da incompetência que tivemos durante seis anos a governar Portugal.»

Portas - «O senhor foi muleta de José Sócrates.»

Passos - «O PSD não é muleta de ninguém.»

 

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ADENDA

Por curiosidade, recordo o que escrevi sobre o debate Manuela Ferreira Leite-Paulo Portas da campanha legislativa de 2009

A Foice, o Martelo e a Ganza

A propósito deste post de Luís Osório:

 

 

Portugal não é para jovens: o velho PCP é mais forte que o "jovem" BE.

 

Até porque em época de crise e éfe éme i o que mais interessa à maioria dos portugueses não são as questões minoritárias (por muita dignidade e, até, urgência que tenham) mas as consequências nas carteiras. São os problemas "velhos" que determinam as próximas legislativas - e são os jovens a não querer assumir uma clivagem entre gerações.

 

 

Em Portugal, a foice e o martelo valem mais do que a ganza - e até os jovens sabem disso.

 

 

P.S.: Não andarão agora as sondagens a subestimar o BE como dantes subestimavam o CDS? Até ao lavar dos cestos ainda se contam votos...

Legislativas (2)

 

 

DEBATE JOSÉ SÓCRATES-PAULO PORTAS

 

Pela primeira vez, que eu me lembre, José Sócrates perdeu um debate eleitoral. Foi esta noite, nos estúdios da TVI, perante um Paulo Portas em boa forma que lhe disse o essencial, olhos nos olhos: este primeiro-ministro "vive na estratosfera". Vive num país só dele, que nega a realidade quotidiana dos portugueses: a dívida pública duplicou em seis anos, há hoje quase 700 mil pessoas sem emprego, o "estado social" tornou-se uma figura de retórica, Portugal viu-se forçado a estender a mão à caridade internacional.

Incapaz de reconhecer um erro, dando continuamente o dito por não dito, sublinhando mais de uma vez que o Governo"deu o seu melhor", Sócrates começou o debate com o ar mais cordato deste mundo: "abertura" e "diálogo" foram as primeiras palavras-chaves do seu discurso. "Portugal precisa de um governo forte", declarou o líder socialista. Nem parecia o mesmo que foi incapaz de esboçar uma coligação pós-eleitoral quando venceu as legislativas de 2009 muito longe da confortável maioria absoluta de que dispôs nos quatro anos anteriores.

Sócrates nunca até hoje tinha ouvido em directo, na televisão, algumas das frases com que Portas o brindou neste frente-a-frente bem moderado por Judite Sousa. Frases que revelam uma realidade elementar: o líder socialista, chefe do Governo desde Março de 2005, "é o político responsável pelo estado a que chegámos". Mais: "Este primeiro-ministro vai perder as eleições porque as pessoas vão votar com os bolsos quase vazios."

Sócrates não tardou a perder o ar de bonomia: a natureza de "animal feroz" acaba sempre por vir à superfície neste homem incapaz de estabelecer pontes com adversários. E com isto estragou irremediavelmente a imagem de indivíduo dialogante que levara para este debate. Apertado por Portas, não resistiu a um número de fácil demagogia televisiva: exibiu uma pasta vazia dizendo que aquele era o programa eleitoral do CDS, que "ainda não existe". Com isto irritou o líder democrata-cristão e marcou certamente alguns pontos junto dos telespectadores. Mas também confirmou que não está minimamente vocacionado para o diálogo político. Sendo aliás ele o campeão dos programas eleitorais por cumprir, esta deveria ser a última das suas opções argumentativas. Lembram-se ainda daquele socialista que prometia criar 150 mil empregos, inaugurar as linhas ferroviárias de alta velocidade e pôr Portugal a crescer 3% ao ano?

 

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FRASES

Sócrates - «Da parte do PS, os portugueses não esperarão nenhuma atitude de radicalismo e sectarismo. Não deixaremos de colaborar, de definir espaços de diálogo e de compromissos com os dois partidos que subscreveram o programa da troika, com o qual o País está comprometido.»

Portas - «Portugal encontra-se numa situação de protectorado.»

Sócrates - «O Governo não pode ser acusado de não ter feito o seu melhor.»

Portas - «Eu nunca disse que não seria primeiro-ministro sem o FMI.»

Sócrates  - «O senhor deputado e o seu partido contribuíram para uma crise política ao chumbarem o PEC IV.»

Portas - «A história não começou há seis semanas: começou há seis anos, com José Sócrates. E começou porque houve uma política irresponsável.»

Sócrates - «Eu invisto no TGV, não invisto nos submarinos.»

Portas  - Para duas pessoas terem uma discussão útil é preciso que habitem a mesma realidade. O candidato José Sócrates não habita a realidade há muito tempo.»

Sócrates - «O acordo [com o triunvirato, vocábulo que Portas prefere a troika, e muito bem] preserva o modelo social em que queremos viver.»

Portas - «O candidato José Sócrates é muito competente a manipular mas não é muito competente a governar.»

Sócrates - «Paulo Portas nunca deu um contributo para que possamos reduzir a dívida, para que possamos reduzir o défice.»

Portas - «Enquanto o senhor dizia que a economia ia crescer, nós víamos a recessão a chegar.»

Sócrates  - «O programa eleitoral do CDS não existe.»

Portas - «O senhor, como candidato, mente mal.»

Sócrates  - «Não lhe admito isso.»

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ADENDA

Por curiosidade, recordo o que escrevi sobre o debate Sócrates-Portas da campanha legislativa de 2009.