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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

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"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Nunca a UDP pensou eleger 8 deputados

 

Não percebo as declarações de Luís Fazenda sobre Daniel Oliveira, muito menos consigo perceber a atitute de Francisco Louçã relativamente a Rui Tavares. O Bloco de Esquerda, de um momento para o outro, transformou-se num PCP ainda mais pequeno que o PCP, sem conseguir fidelizar votos como o PCP e sem assumir o centralismo democrático que ambos os partidos praticam. Luís Fazenda, conseguiu colocar Trotsky na gaveta do BE e impor uma ditadura da UDP perante todas as outras tendências do bloco, tendo como principal protagonista Francisco Louçã, curiosamente dirigente da APSR.

 

Quem tiver dúvidas sobre o novo programa oculto do BE, pode lê-lo aqui.

As divisões do bloco

Rui Bebiano faz aqui uma reflexão sobre o futuro do Bloco de Esquerda, na linha do que escreve Daniel Oliveira, em Arrastão. Para justificar o resultado decepcionante, os autores identificam erros da liderança, sobretudo dois: o anúncio de uma moção de censura e a recusa em reunir com a troika.

Sou observador externo, com conhecimento relativamente superficial do bloco, mas julgo que os comentários que tenho ouvido são injustos para a liderança do partido. As perdas podiam ter sido piores sem o bom desempenho de Francisco Louçã nos debates e a quebra deve-se, a meu ver, ao resultado excepcional obtido em 2009, quando o BE conquistou uma significativa fatia de eleitorado identificado com a esquerda do PS.

Desta vez, o partido foi vítima do voto útil e muitos socialistas da ala esquerda não votaram outra vez BE para tentarem impedir a vitória da direita. No fundo, o BE parece-se com o CDS: não tem máquina partidária, mostra mais força nas zonas urbanas, atrai muitos jovens, a sua expressão autárquica é limitada e os votantes militam pouco e flutuam em excesso.

Mas os textos que tenho lido mostram que o BE discute os seus problemas e que as comparações que se fazem com o PC revelam incompreensão da realidade. Também já ouvi comparar com o Partido Renovador, mas sinceramente não vejo semelhanças. Este é um partido jovem, não institucional, que mal existia em 1998 e que teve a sua primeira votação importante em 2005, semelhante à actual e na altura uma vitória. Está em crise de crescimento, não à beira do colapso. E as suas divisões são sinal de vitalidade.

 

Serve esta introdução para tentar sublinhar um ponto mais largo, sobre a esquerda europeia.

    

 

Bloco de Esquerda: o culto do líder e o afirmar de uma corrente.

 

A Andrea Peniche critica as posições do Daniel Oliveira, relativamente ao pedido de demissão da direcção do Bloco de Esquerda, no blog do próprio Daniel Oliveira. Tirando este facto, que acho interessante, nada mais de relevante esta "militante" trouxe para a discussão. Aliás, este texto mais não é do que uma sumula de argumentos a defenderem mascaradamente o centralismo-democrático que o BE há muito pratica e que Louçã nunca assumiu nos seus discursos.

Os principais críticos a Francisco Louçã, nos últimos anos, foram afastados (a Joana Amaral Dias é o melhor exemplo) e as personagens que lhe podiam fazer frente foram colocadas discretamente na prateleira (Daniel Oliveira desapareceu para o "comentário" e Miguel Portas foi colocado na Europa). Isto para não falar do Ruptura/FER que, mesmo quando representou uma fatia importante da Mesa Nacional do BE, nunca conseguiu ter um único lugar elegível na lista de deputados.

Mas sobre este assunto, já confrontei directamente Francisco Louçã, na blogconf do BE, em 2009. Os vídeos podem ser vistos aqui e aqui. Afinal tinha razão.

Convencionar um bloco de onde parece querer fugir o eleitorado de esquerda.

 

Nesta convenção do Bloco de Esquerda, notou-se nervosismo no ar. Percebeu-se que o esvaziar ideológico, ocorrido desde a transformação dos antigos partidos em associações políticas, começa agora a notar-se ainda mais e a reflectir-se numa perca significativa de eleitorado nas franjas mais jovens da população - especialmente desde que o PS se apoderou de algumas das suas causas ditas fracturantes.

 

O que falta agora ao Bloco? A legalização das drogas leves e da prostituição? Também elas já defendidas há bastantes anos pela Juventude Socialista e por uma grande parte do PS? É desta forma que o BE pretende segurar a votação da "geração à rasca", verdadeiramente interessada é em arranjar um emprego e sair de casa dos pais?

 

Paralelamente, é preciso notar que os tempos são de crise e de agitação social. Neste cenário, a classe média de esquerda vê-se forçada ao voto útil no Partido Socialista, como forma  de manter viva a utopia de um estado social em que mais de um terço da população pode viver às custas do estado. Convém dizer que esta classe média de esquerda trabalha na sua esmagadora maioria para o próprio estado, com regalias que dificilmente conseguiria a trabalhar para o sector privado. 

 

O povo de esquerda é diferente e provavelmente não irá votar PS. Estes homens e mulheres foram os que mais sofreram com os seis anos de governação de José Sócrates. Ao mesmo tempo, continuam sem confiar na direita e têm muitas vezes os sindicatos como referência do seu discurso político. Em altura de crise e sacrifício, é este eleitorado que preconiza a subida do PCP nas sondagens. Ao mesmo tempo, é também este eleitorado que se reconhece no discurso de Jerónimo de Sousa, mas acima de tudo no seu percurso de vida e nas suas origens sociais, bastante diferentes da esmagadora maioria dos dirigentes do BE.

 

Ao fim de 10 anos, o BE começou a perceber que não se conseguiu afirmar como um partido sério. Ao fim de 10 anos, as sondagens demonstram que os portugueses percebem que a política não está para brincadeiras. Na política é preciso construir ideias e traçar caminhos, o BE nunca o conseguiu fazer verdadeiramente.

 

Há dois anos perguntei a Francisco Louçã numa blogconf: "afinal o Bloco quer ser um partido de protesto ou de governo?". O coordenador do BE respondeu-me: "só um partido de protesto merece ser governo". O resultado eleitoral do BE irá explicar a pertinência da minha questão. Dois anos depois começo a ter razão.

Um Efeito Positivo da Moção Anunciada

Um efeito positivo da moção de censura anunciada pelo Bloco de Esquerda foi este: Daniel Oliveira passou a escrever coisas com que uma pessoa de direita (ou de alguma ou algumas direitas...) pode concordar com gosto. São três os exemplos pós-moção anunciada:

 

"Cinco más razões para um disparate" faz a análise das "causas" do anúncio de moção (só não posso concordar com aquela opinião extrema da "direita extremista").

 

"Alemanha e as lições da história": este é um texto excelente (e é a razão principal para que eu escreva este post). Há muitíssima gente a precisar de ler e reflectir neste texto palavrinha por palavrinha, a começar precisamente por muito boa gente de direita! Sim. E, para que não haja confusões, atenção a isto: criticar quem faz de conta que a História Europeia não existe ou que já foi há muito tempo - não é e não pode ser confundido com criticar quem tem sabido governar-se bem. E também não é confundível com a defesa de nenhum governo socialista português...

 

Finalmente, "Salto à Vara". Sobre aquele ser humano socialista que passa à frente de tudo e de todos. A crítica comedida e justa, sem histeria. Em geral, discordo de argumentos baseados na responsabilidade "colectiva" ou "do sistema" e do "somos todos culpados". Mas naquele último parágrafo, Daniel Oliveira tem razão: qualquer pessoa que tenha tido um poucochinho de poder, por mais pequenicles que fosse, já experimentou a bajulação e a graxa - e, provavelmente, sentiu-se "ditadorzinho" - e, menos provável porém, até terá beneficiado um bocadinho. A sobranceria e abuso de uns é também suscitada pela adulação de muitos.

 

 

P.s.: "Os países periféricos (...) Limitaram-se a estar mais expostos aos ataques a uma moeda criada à imagem e semelhança do marco": isto não é bem verdade... as responsabilidades pela crise e seus efeitos, sobretudo nos casos português e grego, não se limitam ao facto de que aqueles países "coitadinhos" perderam a política cambial: se tivessem sabido governar-se, não só a crise não seria tão pesada como o euro até teria sido uma oportunidade muitíssimo mais bem aproveitada.

Moção de Censura de Louçã

Ainda falta quase um mês para ser discutida no parlamento e a moção de censura de Louçã já está a ser de grande utilidade para a democracia portuguesa: nunca Louçã foi tão publicamente censurado por membros do seu próprio partido. A moção de Louçã, mais do que um tiro no pé do Bloco de Esquerda, foi um tiro no pé do próprio Louçã. É bem feita!

A moção de censura do Bloco de Esquerda.

Ao contrário do que muita gente tem dito, a moção de censura do Bloco de Esquerda era um acto mais do que previsível. E não deve ser dramatizada. Na verdade, nos países democráticos a apresentação de uma moção de censura não pode ser vista como um crime de lesa-majestade. O Governo depende do Parlamento e a qualquer momento pode ser derrubado no Parlamento. O que nos distingue de países como o Egipto é que elegemos um Parlamento para fiscalizar e se necessário demitir o Governo, não sendo necessário apelar a manifestações de rua para o efeito.

 

Ora, tendo o Bloco de Esquerda se associado ao Governo na desastrada candidatura de Alegre, é manifesto que teria agora que quebrar essa associação e a moção de censura é o instrumento ideal para o conseguir. Por outro lado, o timing é perfeito. O Bloco antecipa-se ao PCP na censura ao Governo, que se vê obrigado a discutir a sua manutenção em funções nas vésperas de um Conselho Europeu, e logo a seguir à tomada de posse do Presidente. Por outro lado, circula na internet a convocação de uma manifestação da "geração sem remuneração" para 12 de Março, o que permitirá ao Bloco surfar previamente essa onda no Parlamento.

 

A outra grande vantagem da moção de censura do Bloco é que não tem a mínima hipótese de ser aprovada. Discordo por isso do que escreve aqui abaixo o Fernando Moreira de Sá. O Bloco de Esquerda não se vai transformar num novo PRD pela simples razão de que Passos Coelho não vai querer ser o Vítor Constâncio do PSD. É manifesto que o PSD não tem condições para aprovar a moção de censura. E não as tem por culpa própria. Na verdade, os sucessivos apoios do PSD ao Governo manietaram o Partido num Bloco Central parlamentar, da qual não vai conseguir sair sem uma causa muito séria. Na verdade, ninguém compreenderia que, tendo deixado passar medidas altamente gravosas para os cidadãos como a redução de salários, o PSD fosse logo a seguir derrubar o Governo.

 

Ora, quer o Bloco, quer o PCP, quer até o CDS sabem disso, pelo que é de esperar a apresentação sucessiva por estes partidos de moções de censura em 2011, que o PSD será sistematicamente forçado a rejeitar, acentuando assim na opinião pública a ideia de que é o sustentáculo do Governo. É por isso que as moções de censura não serão apenas dirigidas contra o Governo, mas também contra o apoio que lhe tem sido dado pelo PSD. Este estará igualmente debaixo de fogo e será prejudicado por essa censura. No fim, quando o país estiver de rastos, o PSD não deixará de ser responsabilizado eleitoralmente por essa situação. Mas tudo isto era previsível a partir do primeiro momento em que Passos Coelho aceitou ser o parceiro de tango de Sócrates.

 

O que me choca, por isso, é a falta de sentido estratégico que o PSD tem demonstrado na oposição a este Governo. O Partido envolve-se voluntariamente em assuntos que nada interessam ao cidadão comum, como uma inoportuna revisão constitucional ou a enésima comissão de inquérito parlamentar ao caso Camarate trinta anos (!) depois de ele ter ocorrido. Mas não é capaz de dizer imediatamente qual o seu sentido de voto perante uma moção de censura no parlamento. As declarações de Miguel Macedo de que o PSD irá avaliar o assunto com "frieza, ponderação e responsabilidade" só servem para dar gás ao Bloco de Esquerda e dão a imagem de um Partido hesitante numa questão política óbvia e que por isso tem que ter uma resposta imediata. E não vale a pena Passos Coelho estar à espera de uma nova peregrinação de notáveis para anunciar a inevitável rejeição da moção de censura. A política do principal partido da oposição deve estar previamente definida, não andar a reboque de iniciativas alheias e não ser alterável a pedido de ninguém.