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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

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O conflito de gerações

Henrique Raposo, aqui, coloca o problema ao contrário. A geração do Henrique trabalha a recibos verdes. Sim, mas a culpa não é minha, que tenho contrato na empresa onde trabalho.

 

Há aqui simplificações que vale a pena discutir.

Escreve o Henrique: "Um empresário que tem de pagar 30 anos de indemnização por x não vai meter malta nova na empresa, e quando mete, mete a recibo verde". Outra citação: "Portugal não aceita que o empresário é o motor da economia".

O Henrique não parece entender que os "velhos" contratos foram do interesse das empresas que os assinaram. Quando eu fui contratado, era um bom trabalhador disponível no mercado. Os recibos verdes, à época, eram raros e vantajosos, mas serviam para profissões liberais bem pagas. Com o mesmo contrato, duas décadas depois, continuo a ser produtivo, até mais do que era, pois tenho memória e experiência. A velhice conta no trabalho, desde que não seja a cavar valas. Mas o conceito dos recibos verdes foi abusado pelas empresas, que os aplicaram a todos os trabalhadores, criando duas velocidades no mercado. Depois, com o aumento do desemprego, a fórmula tornou-se explosiva, surgindo uma pressão para quebras salariais nos diferentes sectores e criando nos locais de trabalho a ilusão de que enquanto os velhos não forem despedidos, os jovens não sobem.

 

Por outro lado, o trabalhador antigo, se fosse bom, tinha aumentos salariais ao longo do seu contrato, ficando cada vez mais caro. Ora, se houver no futuro uma lei que facilite o seu despedimento, torna-se vantajoso para a empresa despedir o mais velho e contratar um mais novo, não por este ser mais inteligente ou produtivo, mas apenas porque é mais barato. Trata-se de competitividade chinesa, que atingirá tanto os trabalhadores de qualidade como os menos produtivos.

Com esta proposta de lei, o trabalhador novo vai receber contrato? Não. Fica a recibos verdes. Nos raros casos em que houver contrato, a empresa demorará 12 anos a obter o incentivo ao despedimento por via da indemnização mais barata. Que lhe adianta isso? E qual será a taxa de desemprego daqui a 12 anos?

Mas se, por qualquer loucura que se adivinha no horizonte, se alargasse isto a todo o universo laboral, apenas se trocava contratado por recibo verde.

Os trabalhadores "velhos" iriam para a rua, ainda por cima numa idade em que não encontravam trabalho. Condenava-se uma geração à pobreza sem tirar a outra da precariedade.

Mas pensando só na actual proposta, a antiguidade deixa de ter interesse, o que é absurdo. Um trabalhador há 12 anos na empresa recebe a mesma indemnização que receberá outro com 30 anos, isto quando a lei se aplicar a todos, daqui a três décadas.

 

Para o Henrique, os trabalhadores são calões. O que é mesmo económico é ser empresário. Eu não vejo como é possível separar as duas funções.

Mas a frase levanta uma questão. Que raio de sociedade estamos a defender? Uma sociedade em que se fazem divisões destas, como se houvesse uma irreconciliável guerra de classes? Uma sociedade onde triunfa o conceito de conflito de gerações? Onde a culpa da minha precariedade está na segurança do meu pai? 

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