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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

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"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Recordando Marcello Caetano.

 

 

Fico perfeitamente siderado quando vejo constitucionalistas a dizer que não há qualquer problema constitucional em decretar uma redução de salários na função pública. Obviamente que o facto de muitos dos visados por essa medida ficarem insolventes e, como se viu na Roménia, até ocorrerem suicídios, é apenas um pormenor sem importância. De facto, nessa perspectiva a Constituição tudo permite. É perfeitamente constitucional confiscar sem indemnização os rendimentos das pessoas. É igualmente constitucional o Estado decretar unilateralmente a extinção das suas obrigações apenas em relação a alguns dos seus credores, escolhendo naturalmente os mais frágeis. E finalmente é constitucional que as necessidades financeiras do Estado sejam cobertas aumentando os encargos apenas sobre uma categoria de cidadãos. Tudo isto é de uma constitucionalidade cristalina. Resta acrescentar apenas que provavelmente se estará a falar, não da Constituição Portuguesa, mas da Constituição da Coreia do Norte.

 

É por isso que neste momento tenho vontade de recordar Marcello Caetano, não apenas o último Presidente do Conselho do Estado Novo, mas também o prestigiado fundador da escola de Direito Público de Lisboa.  No seu Manual de Direito Administrativo, II, 1980, p. 759, deixou escrito que uma redução de vencimentos “importaria para o funcionário uma degradação ou baixa de posto que só se concebe como grave sanção penal”. Bem pode assim a Constituição de 1976 proclamar no seu preâmbulo que "o Movimento das Forças Armadas […) derrubou o regime fascista". Na perspectiva de alguns constitucionalistas, acabou por consagrar um regime constitucional que permite livremente atentar contra os direitos das pessoas de uma forma que repugnaria até ao último Presidente do Estado Novo.

 

Diz o povo que "atrás de mim virá quem de mim bom fará". Se no sítio onde estiver, Marcello Caetano pudesse olhar para o estado a que deixaram chegar o regime constitucional que o substituiu, não deixaria de rir a bom rir com a situação.

 

 

6 comentários

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    mulumba42 09.01.2011 22:23

    O grande equívoco é dizer-se que o direito serve a justiça quando, de facto apenas serve o económico! O direito do mais poderoso materialmente!
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    Luís Menezes Leitão 10.01.2011 06:23

    Essa é a concepção marxista do Direito com que não estou minimamente de acordo. O Direito é um produto cultural, exprimindo os valores básicos de uma sociedade, entre os quais a realização da justiça é fundamental.
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    mulumba42 12.01.2011 16:08

    Os rótulos não refutam factos! Apenas os incapazes de autonomamente analisar factos respondem à critica com rótulos! Isso para perante terceiros demonizarem pessoas que pensam e agem de modo diferente!
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    Luís Menezes Leitão 12.01.2011 19:10

    Não refutei qualquer facto mas apenas uma interpretação, que não é a minha e que também não é nova, e daí ter referido a sua autoria original. Não pretendo com isso demonizar ninguém, e muito menos através de rótulos. Limito-me a expressar qual a minha perspectiva sobre o que é o Direito, perante as várias que têm sido defendidas. E respeito muito a liberdade de pensamento e opinião, o que não quer dizer que tenha que concordar com ela.
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    mulumba42 12.01.2011 21:32

    Compreendo o discurso para puro deleite intelectual porém, numa altura em que os Paises atravessam crises que "machucam" quem não teve responsabilidade nenhuma para a sua emergência, o puro deleite intelectual, o discurso redondo, sem consequências para o futuro foi o que nos truoxe ao actual estado de coisas!
    Saudações igualmente cordiais
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