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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

O anúncio do Primeiro-Ministro

Mudou-se o Governo, mas o assalto aos rendimentos dos cidadãos continua exactamente da mesma forma, sem qualquer respeito pela Constituição. Já aqui tinha dito o que pensava sobre a tentativa de criar uma "contribuição especial" sobre os rendimentos dos pensionistas. Agora o novo Primeiro-Ministro anuncia uma nova "contribuição especial" — que nada tem a ver com esse conceito, diga-se — em ordem a retirar metade do subsídio de Natal através do aumento do IRS já em 2011. Como isso vai ser feito, ainda não se sabe, mas é manifesto que só pode ser feito criando um imposto escandalosamentre retroactivo, contra o que a Constituição expressamente determina. Na verdade, os rendimentos de 2010 já foram tributados, pelo que se o novo imposto for criado sobre esses rendimentos, haverá uma escandalosa dupla tributação, estando-se a lançar pela segunda vez impostos sobre rendimentos que os contribuintes já pagaram. Já se o imposto recair sobre rendimentos de 2011 — por exemplo, aumentando brutalmente a retenção na fonte sobre o 13º mês ou sobre os meses que faltam até ao fim do ano — estar-se a desvirtuar completamente a figura da retenção na fonte. Em qualquer caso, parece-me evidente que haverá uma séria lesão da confiança dos contribuintes, que vêem as suas obrigações fiscais permanentemente alteradas. Mas seguramente o Tribunal Constitucional lá deixará passar mais uma vez esta gritante inconstitucionalidade. O que me choca é que quem ganhou as eleições prometendo que haveria reduções de despesa e não aumento de impostos, a primeira coisa que faça seja aumentar os impostos.
Na área da justiça, pareceu-me ainda haver uma inversão de prioridades no discurso do Primeiro-Ministro, quando disse que pretendia agilizar os processos de insolvência. Ora, os processos de insolvência são dos mais ágeis que existem, tanto assim  que todos os dias inúmeras empresas e cidadãos são declarados insolventes. O bloqueio no sistema de justiça está antes na acção executiva. É esta que tem que ser urgentemente reformada.
(Publicado também no Lei e Ordem).

A Grécia a ferro e fogo.

 

Cada vez acho mais insustentável a situação na Grécia. O Parlamento Grego, por imposição dos seus credores, aprova atento, venerador e obrigado, o plano de austeridade que lhe exigem. Os Presidentes do Conselho e da Comissão Europeia, cujo papel na gestão desta crise ainda ninguém percebeu qual é, apressam-se a saudar o "sentido de responsabilidade" do referido Parlamento Grego. Entretanto, o voto desencadeia uma verdadeira batalha campal nas ruas de Atenas onde até gás lacrimogéneo é atirado sobre os manifestantes.

 

Mas, apesar de tudo, há boas notícias. A banca mundial fechou em alta, mal foi conhecida a aprovação do plano de austeridade grego e até a Bolsa de Lisboa subiu 2,5%. E até o euro atingiu 1,44 dólares, graças a esta decisão do Parlamento Grego. Parece, portanto, que o Parlamento Grego acaba de prestar um grande serviço à banca europeia, às bolsas e até ao euro. Só os infelizes dos cidadãos gregos, em cujo nome os seus deputados votam, é que provavelmente se irão ver mesmo gregos com o novo plano de austeridade.

Deve ter alguma coisa a ver com o Magalhães... (reply)

Claro que deve. Mas não era suposto a glorificação estar focada na escola?

 

No mesmo link:

Porém, os nossos alunos continuam abaixo da média da OCDE no que se refere ao acesso a computadores na escola.

 

Mas estranho mesmo é que o sempre apurado olho de lince do "Miguel", não tenha feito referência a que o título da notícia seja diferente do que consta no url.

Um algoritmo à procura de autor

 

Porque sou liberal, sempre considerei que o estado a que chegámos é, ao mesmo tempo, pequeno demais e grande demais. Pequeno demais para os nossos grandes problemas. Grande demais para os pequenos problemas do quotidiano, quando os poderosos, fracos perante os grandes, se vingam nos pequeninos. Apenas estou a glosar Daniel Bell e a rir-me de certo espectáculo e de alguma retórica do estadão.

 

A necessidade de desfeudalização, desministerialização e desentorpecimento individual é quase a mesma que a do tempo em que os liberais aboliram a inquisição, extinguiram os serviços feudais, deram direitos às pessoas e libertaram a terra. Até a propriedade já está de novo ensarilhada, sobretudo a propriedade do trabalho.

 

Porque sou reformista nos métodos e radical nos objectivos, também considero que bastava uma dúzia de decretos à Mouzinho da Silveira para refundar o Estado onde ele faz falta e extingui-lo no que ele é inútil. E somando reforço com abolição, a conta seria bem menos mesada. Por outras palavras, não chega liberalizar, impõe-se a libertação. Até dos chamados liberalizadores de fachada.

 

Por isso, duvido de palavras à procura de discurso, num espaço de transacção pleno de cláusulas gerais e de conceitos indeterminados. Procurei, assim, alguns exemplos no programa de governo. E reparei que, em quatro das cinco vezes, a palavra corrupção aparece sob os auspícios da palavra "combate", banalizando os dois termos e gerando contradições, porque uma vezes é posta ao nível do combate "a posições dominantes", outras, equiparada "conflitos de interesses", para atingir o seu auge como secção da política desportiva: "erradicar fenómenos como a corrupção, a violência, a dopagem, a intolerância, o racismo e a xenofobia". Da mesma maneira, em dez das catorze vezes em que aparece a palavra universidade, ela é precedida ou está dependente da palavra empresa, nunca rimando com humanismo...

 

Já a palavra combate aparece 38 vezes... Nação e pátria, nunca. República, só para compromissos internacionais, e uma única vez. Já comunidade tem direito a 26 vezes, mas sem nunca ter o sentido que lhe deu o Infante D. Pedro... Mas, mais do que tudo, a palavra empresa aparece 120 vezes... Por outras palavras, torna-se a medida de todas as coisas.

 

Mas a melhor forma de reforçarmos o colectivo está na multiplicação de indivíduos autónomos, responsáveis e disponíveis para compreenderem que o nós está dentro do eu, porque o nós precede o eu. Sem indivíduo e sem comunidade não há nada: nem empresa, nem, muito menos, ideia de obra. Não há pessoa que não tenha dentro de si uma dimensão individual e uma dimensão comunitária. Humanismo é isto: gerar manifestações de comunhão e pilotar o futuro, mobilizando o todo, através de cada um.

 

Aliás, não é apenas por coincidência que os países que estão na dianteira da economia mundial são os que mais investem em humanismo. Comecemos pelas universidades norte-americanas... até em teologia investem! Passemos depois para o Vaticano que, ao que consta, Jesus Cristo era dos que não sabia nada de finanças, da mesma maneira que o Estaline desdenhava as legiões do Vaticano. João Paulo II, o tal humanista, deu-lhes a volta como nós sabemos...foi, aliás, o tal humanismo que derrubou o Muro e inventou essa coisa do capitalismo, com a devida ética protestante.

 

Não é por acaso que a parte mais fluente do programa, para além do prefácio, ainda em ritmo de "Mudar", está nos negócios estrangeiros; a mais convicta, embora fragmentária, na justiça; e a mais sintética e contida, na defesa dita nacional. Embora a palavra Europa só apareça seis vezes, até na comparação provinciana de, em saúde, alcançarmos "os melhores da Europa".

 

Os requintes de arte "naïf" que emergem da secção agrícola do programa para uso do Portugal dito profundo contrastam com o sentido técnico consolidado de alguns "clusters" da inovação, da ciência ou da política do mar, embora a parte do Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria ainda não atinja o nível republicano do Fomento, ou da geração que nos integrou na EFTA e, consequentemente, na Europa.

 

Por outras palavras, e em emergência sarcástica, o programa de governo não passa de um programa à procura de autor, apesar de muitos actores embevecidos e dos auditores passivos que o têm de pagar, mesmo que ele, com tantos algoritmos, não esteja minimamente quantificado, até em termos cronográficos e de previsão de planos B, com GPS avariado pelo desaparecimento das condições propícias da balança da Europa! Continuo a preferir o livro "Mudar".

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