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Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Albergue Espanhol

"-Já alguma vez estiveste apaixonado? - Não, fui barman toda a minha vida." My Darling Clementine, John Ford.

Indignação

A RAI tomou uma das medidas mais estúpidas de que eu já ouvi falar: vai deixar de passar repetições de lances controversos (uma medida que, para além de estúpida, não serve para nada, porque a RAI passa pouco futebol ou quase nenhum). O director da RAI, numa frase de incomensurável burrice e profunda incultura desportiva, disse que este gesto que-se-quer-fidalgo servia para que, a partir de agora, pudéssemos todos “pensar futebol” (expressão horrível) com “mais profundidade e menos gritaria”: puro disparate, porque o futebol também é gritaria, também é polémica, é para ser gozado na antevisão do jogo, gozado no acto de o jogar e de o ver jogar e gozado na discussão posterior e tendencialmente infindável do que foi jogado. Esta besta quer acabar com as colunas do Rui Santos, com os programas do Pôncio, com as discussões nos cafés, com as discussões ao jantar, com as discussões nos intervalos, com os berros, com os impropérios, com as ameaças de cabeçada – esta besta quer o quê? Com esta medida, a RAI mostrou the shape of things to come; as repetições já não passam nos ecrãs gigantes dos estádios, para não enfurecer as massas, que se presumem estúpidas e ceguinhas (e que o conhecimento da verdade poderia desinquietar); a UEFA já só permite uma-repetição-só-uma nos jogos da Liga dos Campeões, por causa das escandaleiras e dos roubos de igreja que também lá há; e a associação italiana de árbitros também achou muito bem, para os seus filiados poderem continuar a fazer merda e dormir depois descansados. Com esta medida, a RAI escreveu também filosofia sem saber: o futebol asséptico que ela nos oferece – sem erro que se veja, sem contestação da autoridade e sem conflito – é uma gigantesca parábola do mundo que se prepara – mas que a força do futebol de rua sempre impedirá que venha a triunfar sem oposição. Se o futebol é a vida, o novo sanitised football que nos querem impingir (tão emocionante como uma partida de curling) é um desporto de mortos-vivos.

 

(Publicado também no 5dias)

A caminho da República (4)

85 (12 de Julho de 1910)
No Entroncamento ocorreu um escândalo que provocou um motim e que ilustra bem o conflito social latente e o anti-clericalismo que grassava na sociedade. Uma jovem de Portalegre, Maria Valéria, cuja idade não é referida, foi interceptada na estação de comboios quando viajava na companhia de duas irmãs da caridade do Convento das Trinas. O relato é confuso, mas parece que um irmão militar foi avisado por telégrafo da fuga da menor e ali a interceptou. As religiosas foram acusadas de rapto, mas a situação tornou-se explosiva quando os populares se aperceberam. Houve uma tentativa de perseguir (e talvez espancar) as freiras, que se refugiaram numa das carruagens.
Maria Valéria regressou a Portalegre, onde foi entregue à família. A jovem desistiu da sua vocação religiosa, mas o caso tinha de tal maneira excitado a imaginação popular, que houve uma manifestação de protesto, de operários locais. A superiora das Trinas era entrevistada pelo DN a justificar o procedimento do convento. A religiosa explicou que a rapariga não teria sido admitida se não tivesse apresentado todos os documentos relevantes. E o procedimento de já a levar vestida com hábitos era normal. A religiosa afirmou não saber que a noviça era menor, mas neste caso foi bem curiosa a reacção intempestiva do povo, que de imediato sentenciou que se tratava de rapto.

 

84 (13 de Julho de 1910)
El-rei D- Manuel II partiu para o Bussaco (era assim que se escrevia) e foi aclamado com grande entusiasmo pelo povo ao longo do percurso. Nesta notícia não há qualquer indício de crise iminente ou dificuldades políticas. Pelo contrário, parece reinar a tranquilidade. A comitiva real passou pela Figueira da Foz, que na época era a zona balnear mais importante do país, devido ao seu elegante casino, e continuou até ao Luso.
“No expresso de hoje, da 1,50 da tarde, chegou ao Luso, sua majestade el-rei que, tanto na estação da Pampilhosa como na do Luso, teve uma carinhosa recepção, sendo levantados entusiásticos vivas a el-rei, sua augusta mãe e restante família. As gares das duas estações, que se achavam engalanadas com flores e ramos azuis e brancos, viam-se apinhadas de povo, sobretudo na Pampilhosa, onde a classe operária aclamou delirantemente el-rei que, com a bondade que o caracteriza, a todos agradecia bastante comovido pela grandeza da manifestação”. [A ortografia foi modernizada e repare-se na quantidade de vírgulas neste texto, com excessos e lacunas].
Na coluna “Martyrológio da Aeronáutica”, constava no DN uma notícia sobre mais uma catástrofe aérea, desta vez na Alemanha, onde um dirigível caíra de grande altura, com horríveis consequências para os cinco passageiros que iam a bordo.


83 (14 de Julho de 1910)
No efervescente cenário político português, e apesar de ser Verão, aceleravam as actividades políticas, com monárquicos e republicanos a multiplicarem as acções de propaganda. Uma sessão na Liga Monárquica é narrada na edição do DN de dia 15, referindo-se ao que acontecera na véspera, uma quinta-feira. O senhor Arthur Queiroz tomou a palavra para explicar a situação, que estava altamente polarizada em pró-governamentais e bloco republicano. A sessão incluiu vivas à família real e discursos com apelos ao voto.
Na mesma noite, no Porto, o Partido Republicano realizou uma conferência de propaganda anti-clerical, proferida pelo doutor Alfredo de Magalhães, “ilustre lente da Escola médico-cirúrgica do Porto”. Ao lado do orador, e a presidir à sessão, estava um futuro presidente, Teófilo Braga.
A notícia do DN descreve as afirmações do orador: “o povo português, pela estrutura do seu protoplasma, é um povo admiravelmente fadado para a filosofia livre, para a independência de opinião”. Mais à frente, o orador explica “que não há questão religiosa em Portugal. O que existe é uma questão reaccionária, a questão clerical”. E, acrescentou, o “partido republicano tem sido descuidoso e imprudente, não atacando a base primacial”, que era o poder da Igreja sobre as escolas. Partidário da “revolução”, o médico afirmou que a “realização desta depende da paciência e da oportunidade”. Certamente, Alfredo de Magalhães não podia imaginar que faltavam 83 dias para que as suas palavras fossem proféticas.


82 (15 de Julho de 1910)
Em 1910, não havia muito noticiário internacional, dada a lentidão com que circulavam as informações e talvez a própria falta de interesse do público pelos acontecimentos no estrangeiro. Mas havia excepções notáveis, como o “facto inaudito” que foi noticiado na edição de sábado, 16 de Julho, terá acontecido em dias anteriores, sem dúvida, mas foi conhecida no dia 15, pelo menos em Portugal. Para um contemporâneo, era um acontecimento da véspera.
Em Castel Nuovo, perto de Nápoles, um abastado comerciante de vinhos chamado Miguel Rea foi detido pela polícia. O homem, de 43 anos, enlouquecera em 1905, pensando que a mulher o traía com um cunhado padre. Mandou tapar todas as janelas do palácio, menos as do andar mais alto e manteve a mulher e os onze filhos presos no interior. Cada prisioneiro da família Rea ocupava um quarto com porta de ferro.
O homem manteve-se armado de revólver a controlar a entrada do palácio e encarregava-se de alimentar os doze prisioneiros, que foram libertados pela polícia italiana, esfomeados e em péssima condição de saúde.
Na mesma página da mesma edição, outra notícia internacional dava conta de um atentado falhado contra Afonso XIII, rei de Espanha. Um anarquista fora preso antes de poder concretizar o crime.
      
81 (16 de Julho)
Sábado de Verão, sem notícias de jeito. Isso não impediu a edição do DN de domingo, 17, de trazer uma nota rara em que a redacção refere que “a falta de espaço” impedira a publicação de rubricas habituais, a Crónica do Porto e a Crónica Literária. De resto, a edição é bastante aborrecida, com umas referências políticas às movimentações partidárias, um “martyrológio da aviação” (ferimentos graves para o aviador Boyle, em Bournemouth) e uma coluna inteira, com fotos, sobre os novos doutores de Coimbra: Fernando Duarte Silva de Almeida Ribeiro, Sérgio Ferreira da Rocha Calixto e João Emílio Raposo de Magalhães.
Curiosamente, na coluna diária sob o título “El-Rei no Bussaco”, duas não-notícias:
“Sua majestade, depois do costumado banho no Luso, recolheu ao seu aposento. De tarde continuou passeando na mata, mostrando sempre boa animação”.
De Coimbra chegava outra preciosa informação: “Consta que el-rei vem amanhã a Coimbra assistir à cerimónia dos doutoramentos, tomando lugar numa tribuna, como particular”. [modernizámos a ortografia].
Falta de espaço? Parecia que, pelo contrário, o país bocejava.

 

Estas crónicas baseiam-se nas edições do Diário de Notícias das respectivas datas e estão a ser publicadas diariamente no DN. Não têm intenção de provar qualquer ideologia, mas apenas de relatar o ambiente da época

Ideias fantásticas

Estas notícias são fantásticas. O vídeo vem em inglês, mas vale a pena ouvir o astrónomo Dimitar Sasselov:

 

Duas ideias, portanto. Na nosso galáxia há milhões de planetas da dimensão da Terra e a vida parece ser um fenómeno banal. 

Na véspera de Augusto chegar, quando o controleirismo nos quer encavacar alegremente

 

ABC do controleirismo Os controleiros do sistema estão felizes no controlo do "agenda setting". Fernando Nobre bem pode apresentar o seu mandatário, João Ermida, na quarta-feira, mas nem uma nota pé-de-página nas duas primeiras televisões nacionais, nos dois principais semanários e nos dois principais quotidianos. A dita Liga Profissional da Partidocracia quer mesmo encavacar-nos com alegria...

 

Autonomia da sociedade civil I Lula diz que não. Claro que não. Foi tudo autonomia da sociedade civil. No planalto dos fundos de pensões. O nosso zé é que gosta de ser mais desajeitado e até diz que utilizou a "golden share" para fins bem diversos daqueles para os quais a lei criou a mesma instituição. Seguiu a letra da lei, mas sem cumprir a "mens legis". Porque, segundo o maquiavelismo dominante, os fins justificam os meios...

 

Autonomia da sociedade civil II Só de vez em quando é que podemos proclamar: o que é bom para o espírito santo, é bom para Portugal. Desconfio de todos os que teorizam música celestial e literatura de justificação em nome da empregomania, própria ou dos familiares, ou do cumprimento da troca de favores cientelares e de velhas cunhas...

 

Estado a que chegámos O nosso querido cérebro social, de tantos estrategistas e espiões emitindo traduções em calão, começa a nem sequer pensar, de tanta gordura sem músculo e de tanto apetite sem nervo. Até os ossos que lhe davam esqueleto começam a estalar, de tanta descalcificação. Isto não vai apenas com "jogging"...

 

Esquizofrenia Passar do oito ao oitenta e do oitenta ao oito. Ai dos povos que passam a ser unânimes numa opinião ou num hábito. Podem volver-se em rebanho dos fazedores do "agenda setting". Tanto os que vêm da Presidência do Conselho. Como os das agências de comunicação das forças vivas. Não são sociedades secretas ou discretas. São meras empresas da geofinança que defendem os respectivos interesses.

 

Freeport O processo está fechado. O processo pode ser reaberto. Nem o roque finge que é rei. Até quando continuarão a procuradurar abusar em geral da nossa republicana paciência?

 

Mandar Manda quem manda porque manda, nem/ Importa que mal mande ou mande bem./Todos são grandes quando a hora é sua./Por baixo cada um é o mesmo alguém (Fernando Pessoa, 1935).

 

Pedagogia da resistência Os indivíduos, se fossem bem educados por uma pedagogia de resistência, e não do colectivismo das seitas, deveriam copiar os grandes bancoburocratas e constituir grupos de interesse e de pressão, especialmente quando os partidos começam a não cumprir a respectiva missão, interpretando os interesses estratégicos do país, conforme os relatórios de forças alienígenas...

 

Sondagens Nada de novo debaixo do sobe e desce. Haverá quem diga que foi tudo por causa do Paulo Teixeira Pinto. Ou pela rasteira do liberalismo. Quase apetece repetir o grande jornalista republicano, João Chagas: caso não haja povo (republicano), é preciso construí-lo! Mas nada de levar a coisa à letra, mesmo que falte um rei para matar. E boas férias...

 

Todos ganham....Afinal, no caso vivo/pt, ganharam todos. Talvez seja verdade. Quem se submete para sobreviver, talvez possa continuar a lutar para continuar a viver. Isto é, há que jogar dentro das regras do jogo e utilizar alguns trunfos...

Os "encostados"

 

"Portugal hoje é isto: um país que empobrece, que não ganha para sustentar o seu Estado e em que a única saída possível parece estar não na alteração desta forma de viver, mas sim no conseguir fazer parte dela. Ter um “encosto” é o sonho de qualquer um e mesmo no sector privado o sonho é trabalhar por encomenda dos encostados e protegido pelos encostados. A única coisa que perturba o mundo do encosto é a mudança. Os encostados, as famílias dos encostados, os privados que fazem negócios com encosto e que precisam do aval dos encostados… ou seja, os portugueses na sua quase totalidade não só querem, mas sobretudo precisam que tudo se mantenha como está. É esse o seguro de vida política de gente como José Sócrates e Alberto João."

 

Helena Matos. Também aqui.

Paredes de Coura 2010

 

 

 

O Festival de Paredes de Coura chegou a meio. Uma boa altura para um pequeno balanço:.......................................já está.

 

Ora, Paredes de Coura continua a ser um evento especial. Pelo espaço, pelo cartaz e pela fauna. É impressão minha ou este ano o número de adolescentes (13, 14 e 15 anos) cresceu imenso? Ontem, primeiro dia de palco principal, já se respirava a festival. Conseguir estacionar o carro já era tarefa complicada e o vizinho do Sr. Joaquim das couves estava fulo com a anarquia no meio do seu terreno - eu nem arrisquei, pirei-me rapidamente antes de ver o meu menino perfurado por chumbo grosso. A moldura humana já impressionava. Hoje chegam os festivaleiros de fim-de-semana e com o calor que se faz sentir é nova enchente pela certa.

 

O "dono" da barraca das caipirinhas é um tipo amigo do cliente: duas caipinhas levaram meia garrafa de cachaça 51! Isto é saber servir, ehehehe, que o diga a miúda que arriscou apenas com uma sopa no estômago - ouvi dizer que hoje anda a chá  e bolachas de água e sal . Por sua vez, as bifanas estavam divinais. Só falta um espaço de gastronomia local com uns valentes rojões, óptimos para combater o calor asfixiante...

 

O "grande" Álvaro Covões estava bem disposto e não parava de perguntar "onde está a crise?". Que nenhum jornalista se atreva a falar-lhe  na economia nacional que ele dispara logo!

 

Hoje as atenções estão centradas nos "White Lies" (23h) e nos "Klaxons" (01h). Até logo.

 

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