O futuro dos jornais
André Abrantes Amaral escreve sobre o futuro da imprensa em O Insurgente. Aparentemente, o texto respira bom senso. Na prática, revela incompreensão da verdadeira crise dos jornais.
O negócio tem matéria-prima cara: a informação, a mão-de-obra, o papel, a impressão. Os custos são suportados através da publicidade. O autor afiirma que não compra jornais há cinco anos. E este é exactamente o problema: as pessoas querem informação gratuita, quando esta é dispendiosa. AAA paga uma subscrição electrónica de um jornal americano, compra umas revistas estrangeiras, lê uns blogues. Desconhece os acontecimentos do seu próprio bairro e não consome um cêntimo de publicidade.
O modelo económico deste leitor parece insustentável. Os jornais cometeram hara-kiri com a questão dos sites electrónicos gratuitos, pois deram a entender ao seu público que a informação devia ser grátis. Mas no meio digital nunca conseguiram cobrar a publicidade que os sustentaria. Daí que só haja uma saída: os conteúdos serão pagos. Se a informação chega pelo ipad ou no computador de casa, isso é mais ou menos irrelevante. AAA pagará no futuro mais pela sua informação. Oferecer conteúdos não faz qualquer sentido para as empresas e quanto menos jornais houver semelhantes ao WSJ, mais o autor pagará. Continuará, naturalmente, a não saber o que aconteceu no fundo da sua rua. “Fio-me pelo que se publica na blogosfera”, explica, sem acrescentar que fica vulnerável aos rumores, boatos, a versões, zunzuns e ruído.
Curiosamente, a análise do artigo parte de um exemplo nacional que não tem nada ver com esta crise. O “i” é um projecto contrário aos “jornais à antiga” de que fala AAA e não “noticia tudo e mais alguma coisa”. O conceito é outro, desenvolver notícias específicas e ignorar outras. Neste caso, o investidor parece estar cansado de investir no projecto, mas o problema não está no conceito, estará numa má previsão de custos.
Escreve o autor: “Julgo que ainda se vislumbra uma réstia de esperança para a imprensa escrita portuguesa”. A solução, adianta, são “publicações mais especializadas, envolvendo pequenos investimentos, com custos de manutenção bastante controlados”.
Passando por cima da redundância da “imprensa escrita”, discordo desta visão. Isto leva a jornalismo irrelevante. Os maiores custos de um jornal estão na redacção, com a mão-de-obra especializada e as facturas de enviar repórteres a lugares onde há acontecimentos. Mas os “custos controlados” são, neste negócio, a fórmula do insucesso. Há uma espécie de corrida aos armamentos em inverso. Cortes no número de jornalistas e aumentos de “produtividade” que são apenas reduções de qualidade do produto final. Até que só haja uma mão-de-obra verdadeiramente barata, capaz de fazer jornalismo simplista que dê mais leitores às subscrições de jornais americanos. Ou seja, menos publicidade e menos receitas, o que leva a novos cortes nos custos controlados.
Nessa morte lenta, cada vez mais portugueses ficarão sem saber o que se passa no fundo da sua rua.