Observação em tom de panfleto
Miguel Botelho Moniz escreve este conjunto de pérolas em O Insurgente, numa tentativa de criticar um post lúcido de Nuno Gouveia cujo excerto subscrevo. O contexto da polémica é um conflito antigo e que, presumo, as legislativas não resolveram. Há um sector da direita blogosférica que detesta Pedro Passos Coelho, não porque lhe encontrem algum verdadeiro defeito político, mas porque.
Enfim, não gostam das referências suburbanas, da classe social, do corte de cabelo, da escolha de gravatas, do discurso redondo, da boa educação, do nome social-democrata, das alusões liberais, e vice-versa. Não gostam, ponto.
Reparem na prosa: para o autor de Insurgente, "Passos tem de fazer prova de que é mais do que um mero anti-Sócrates e que merece a confiança...". Mas quem é que diz que os portugueses votaram nisto? Eu não votei num anti-Sócrates, votei em Passos Coelho e na estabilidade governativa e nas soluções para a crise e num primeiro-ministro que pudesse aplicar o programa da troika.
"O melhor que pode acontecer a este governo é ser criticado pelos seus apoiantes; só assim poderá emendar a mão", escreve Botelho Moniz. Concordo em teoria, mas será que isto faz sentido ao fim de meras duas semanas, para apoiantes ou não apoiantes do PSD e do CDS, quando não vimos nada, quando a oposição está ainda sem estratégia? Não seria prudente esperar um bocadinho?
Em democracia existe a tradição, julgo que saudável, do chamado estado de graça dos governos recém-eleitos, que costuma durar cem dias. As pessoas bem informadas sabem que um governo pode tomar muitas decisões nesse período, até cometer erros, mas que só estará de facto a controlar o País ao fim de, no mínimo, seis meses. Existem máquinas administrativas cheias de complexidades que prolongam este processo por quase um ano. Veja-se, para citar um exemplo pequeno, as férias dos funcionários públicos; para citar outro, o exemplo criticado no post, pois sendo necessário criar receitas depressa, para colmatar um buraco inesperado, optou-se por uma solução que dá receitas depressa. Também pago e isso chateia-me, mas a situação é o que é.
A legislatura tem quatro anos e será apenas em 2015 que os portugueses terão de pronunciar um veredicto sobre este governo. Dois anos antes, em 2013, há eleições europeias e autárquicas, onde poderão apresentar o também tradicional cartão amarelo. Entretanto, podem manifestar-se nas ruas e protestar nos blogues e jornais.
Mas, de preferência, quando tiverem alguma coisa para dizer, o que não é o caso, pois não se percebe o que faria o autor na siituação onde vislumbra "facilitismo e conveniência política".
Acho normal que os tenores socialistas já critiquem o governo e não respeitem o estado de graça, mas nunca tinha visto esta fúria dos "apoiantes", ainda por cima com a ressalva de quem os criticar estar a ser um socrático. Extremamente cómodo: o alegado apoiante critica Passos quando este ainda só teve tempo para dois conselhos de ministros, mas se vier alguém achar que isso é prematuro, aqui-d'el-rei, que é um corporativo laranja. Isto é à prova de bala, pode criticar-se à vontade sem temer ataques e ainda por cima derramando uma lágrima de crocodilo, perdão, de apoiante.
Para concluir. Miguel Botelho Moniz: o senhor não é apoiante coisíssima nenhuma. É um crítico da oposição, assim deve ser lido, e isso não tem mal. Assuma-se.